=Paper= {{Paper |id=Vol-1667/CtrlE_2016_AC_paper_16 |storemode=property |title=A Construção do Conhecimento Colaborativo no Ciberespaço: Uma Análise das trocas comunicativas do Grupo XENSERVER no aplicativo TELEGRAM |pdfUrl=https://ceur-ws.org/Vol-1667/CtrlE_2016_AC_paper_16.pdf |volume=Vol-1667 |authors=Ellen Lacerda Carvalho Bezerra,Mércia Figueiredo,Paulo Farias Camelo Filho }} ==A Construção do Conhecimento Colaborativo no Ciberespaço: Uma Análise das trocas comunicativas do Grupo XENSERVER no aplicativo TELEGRAM== https://ceur-ws.org/Vol-1667/CtrlE_2016_AC_paper_16.pdf
          A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO
     COLABORATIVO NO CIBERESPAÇO: UMA ANÁLISE
        DAS TROCAS COMUNICATIVAS DO GRUPO
        XENSERVER NO APLICATIVO TELEGRAM
Ellen Lacerda Carvalho Bezerra1, Mércia Figueiredo1, Paulo Farias Camelo Filho1
                                       1
                                           Mestranda, UFC
                                       2
                                           Mestranda, UFC
                                      3
                                           Mestrando, UFC
 1
     Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC),
                               Fortaleza – Ceará – Brasil
             {ellen.lcb7, merciaval42}@gmail.com, paulo@camelo.info

       Abstract. This paper looks to understand how communicative exchanges occur
       between advanced users who share in a network common interests. We analysed of
       a Telegram (app) XenServer group. We present the context of the group creation,
       cyberculture’s interactivity, network learning, collaborative writing and
       communicative. The project has a qualitative basis. The analytical trajectory
       followed some steps: choice of a group where discussions were generated around
       specific professional topics; selection of the Telegram app, and more specifically
       the XenServer group; some print screen analysis; and a data selection. It was
       identified how does the discussion of collective written practice happens in a
       learning-teaching network in this specific community.
       Keywords: Cyberculture; Interactivity; Learning.
       Resumo. Este trabalho buscou compreender como se dão as trocas comunicativas
       entre usuários avançados que compartilham em rede interesses comuns.
       Realizaram-se análises do grupo XenServer no aplicativo Telegram. Apresentou-se
       o contexto de criação desse grupo, a interatividade na cibercultura, a aprendizagem
       em rede, a escrita colaborativa e as trocas comunicativas. O estudo teve base
       qualitativa. A trajetória metodológica seguiu as seguintes etapas: a escolha de um
       grupo em que fossem geradas discussões de assuntos específicos ocorridas por
       usuários avançados; seleção grupo XenServer; análise das capturas de telas; e
       recorte dos dados. Identificou-se como decorre a prática de escrita coletiva no
       contexto de ensino-aprendizagem nessa comunidade específica.
       Palavras-chave: Cibercultura; Interatividade; Aprendizagem.

1. Introdução
A contemporaneidade é marcada por intensas transformações tecnológicas e sociais, em
que emergem novas modalidades comunicativas nos ambientes digitalmente interativos,
como nos grupos constituídos com fins comuns de comunicação, sendo evidenciada a



                                                                                             70
troca de saberes, que consiste no compartilhamento de ideias, bem como na construção
dialógica sob vertentes diversas que as mídias oferecem ao usuário.
        Assim, este trabalho visa a fazer uma análise de uma experiência no ciberespaço,
tratando de abordagens no contexto da aprendizagem e tendo como objeto de estudo um
grupo criado por profissionais da área de informática em um aplicativo de bate-papo
chamado Telegram1, com o intuito de trocar experiências sobre um tipo de software
específico, o XenServer2, que funciona como gerenciador de máquinas virtuais utilizadas
para prover serviços de internet.
        As análises fundamentam-se nesse grupo específico, por fornecer elementos
relevantes para compreender, na prática, alguns importantes temas trazidos pelo estudo da
cibercultura no campo da educação, tais como a interatividade, a aprendizagem em rede e
a dinâmica de processos formativos em grupos constituídos por usuários avançados na
internet.
       Então, com base nessas abordagens, levanta-se como perguntas deste trabalho:
como ocorrem as trocas colaborativas do grupo XenServer e de que forma esse fenômeno
contribui para a construção dos conhecimentos específicos desses usuários?
        Este artigo está estruturado em seis seções: inicialmente foi abordada a metodologia
que envolve o trabalho. Em seguida é apresentado o grupo XenServer no Telegram e como
suas características favorecem a criação de um grupo focado em um tema específico. No
terceiro momento aparecem as discussões e os autores que teorizam a cibercultura, que
apontam caminhos para o estudo da interatividade em rede. Mostra-se como é construída a
aprendizagem em rede e como ocorrem as trocas comunicativas desse grupo. Apontam-se
também pistas que procuram elucidar que tipo de dinâmica o grupo constrói para pôr em
prática seus objetivos de enriquecer suas bases de conhecimentos nesse ambiente do
ciberespaço. Por fim, apresentam-se as considerações finais.

2. Abordagem metodológica
Neste tópico, aborda-se a construção deste estudo para se atingir o objetivo proposto, que
consiste em analisar como ocorrem os processos de aprendizagem, bem como a escrita
colaborativa nesse contexto específico da cibercultura, com base nas interações entre os
usuários do grupo pesquisado.
       A trajetória metodológica seguiu as seguintes etapas: a) escolha de um grupo em
ambiente virtual que apresentasse características de processos de aprendizagem; b)
seleção do grupo XenServer, por apresentar esse quesito e ainda trazer elementos novos,
como a ausência de tutoria e o alto nível de conhecimento dos participantes; c)
observações das conversas e coleta de capturas de telas. Esta pesquisa se ancora no


1
  Conforme dados contidos no Wikipédia (2016, s.p.): “Telegram é uma aplicação multiplataforma de men-
  sageiro instantâneo, com seu cliente em código aberto e servidores em software proprietário, tendo seu foco
  na segurança e privacidade. Além de mensagens de texto criptografadas e opcionalmente autodestrutivas, os
  usuários podem enviar fotos, vídeos e documentos (todos os tipos de arquivos suportados). Está oficialmente
  disponível para diversos dispositivos, como Android (incluindo tablets), iOS (incluindo iPad), Windows
  Phone (ainda em versão beta), Windows, OS X, Linux e um cliente web; outras plataformas e clientes alter-
  nativos podem existir a partir de desenvolvedores independentes que usam o API do Telegram”.
2
  O Citrix XenServer é uma plataforma líder de virtualização de servidor e gerenciamento de recursos de
  hardware de máquinas virtuais. É um produto da empresa americana Citrix Systems.


                                                                                                         71
acompanhamento das interações do grupo que ocorreram entre julho de 2015 e janeiro de
2016.
       Devido à grande quantidade de dados coletados no intervalo de tempo em que a
pesquisa foi realizada, surgiu a necessidade de recortes, e, assim, as observações foram
focadas no processo comunicativo de dois integrantes do grupo, aqueles com maior índice
de atuação, para as análises mais específicas, com o propósito de enfatizar a construção
dos diálogos e a interação constante que leva o envolvimento da maioria dos membros
desse grupo.
       A pesquisa foi delineada em critérios da abordagem qualitativa assentada em
inferências do que foi observado na construção de diálogos entre os participantes do
grupo. Nessa medida, Bogdan e Biklen (1994, p. 167) asseveram sobre essa abordagem,
apontando uma importância para os processos, ao afirmarem que a pesquisa qualitativa
tem como objetivo principal “[...] compreender de uma forma global as situações,
experiências e os significados das ações e das percepções dos sujeitos através da
elucidação e descrição”.
       Veremos abaixo como é constituído o grupo estudado e como se dão seus
processos comunicativos.

3. O contexto de criação do grupo XenServer no Telegram
O grupo Citrix XenServer no Telegram surgiu3 a partir da necessidade de uma forma mais
dinâmica de interação entre as pessoas que precisavam de auxílio nas atividades que
envolvem o programa XenServer nas práticas cotidianas. Os usuários do grupo, na grande
maioria, também são membros de um fórum4 aberto do programa na internet. No
momento da coleta, o grupo no Telegram contava com 116 membros, sobre o qual, por
meio dos depoimentos e das observações, pode-se afirmar que grande parte desses
indivíduos é formada por profissionais com nível superior, geralmente atuantes no
mercado de trabalho, sendo muito requisitados por empresas e instituições por dominarem
as tecnologias de ponta no âmbito de informática e internet.
        Essa informação é relevante, haja vista que dominar o ofício é um fator
fundamental no mercado de trabalho dos técnicos de tecnologia da informação que
trabalham em Data Centers5. Assim, esse elemento pode dar pistas para o porquê da
escolha de uma ferramenta de acesso restrito para a troca de informações preciosas.
       O ingresso no grupo se dá mediante convite dos participantes. Apesar de não haver
moderação nesses convites, diferentemente do que ocorre no fórum, as informações não
estão disponíveis para todos, mas apenas para os participantes do grupo. Mesmo sendo
um grupo fechado, seus membros não se furtam em compartilhar conhecimentos entre si
e, quase sempre, são solícitos em responder também às questões no fórum aberto, que
continua ativo.




3
  Essas informações peculiares à construção do grupo no aplicativo Telegram foram obtidas por meio de
  uma entrevista presencial realizada por um membro da equipe que fundamenta este trabalho.
4
  O fórum permanece ativo e pode ser acessado em: .
5
  Centros de processamento de dados nos quais estão as máquinas físicas responsáveis pelos servidores de
  internet.


                                                                                                        72
        A ferramenta de interação escolhida para a criação do grupo, o Telegram, é uma
aplicação de código aberto6, com sede em Berlim, na Alemanha, e de multiplataforma.
Isso significa que pode ser usada em diversos dispositivos, browsers7 e sistemas
operacionais diferentes. Essa característica possibilita aos membros uma maior decisão
de escolha no uso do aplicativo. Outra característica do Telegram é sua política de
privacidade e segurança das informações, ofertando inclusive criptografia nas conversas.
Isso pode justificar a escolha do aplicativo por um grupo de usuários que trocam
informações sensíveis, como no caso pesquisado. Oferece ainda o envio de imagens,
vídeos, áudios e arquivos. Cada membro escolhe uma imagem e um nome de usuário que
serão vistos por todos.
        O Telegram não é um aplicativo específico para fóruns, tendo em vista que foca a
comunicação direta. Ainda assim, é possível criar grupos e canais. Os usuários, ao
instalarem o aplicativo, são solicitados a adicionar amigos pela lista de contatos do telefone
ou do e-mail, assim, automaticamente, quem estiver nessas listas será adicionado como
contato. Outra forma de recrutamento pode ser feita por meio de uma busca por nomes de
usuários, semelhante a outras ferramentas e websites com características sociais. No
intervalo de tempo em que se observou o grupo, poucos participantes saíram, alguns nunca
se manifestaram, no entanto o que prevaleceu foi a interação entre a maioria dos membros,
expondo ou mesmo respondendo às dúvidas sobre o Xen.
         Ao observar as imagens escolhidas pelos usuários para serem identificados no
grupo, constituindo avatares, com seus nomes, constataram-se pistas de um grupo
relacionado com Linux8 e virtualização, especialmente pelo uso de símbolos conhecidos
por quem atua na área técnica de informática para servidores9. Como exemplo, pode-se
citar o símbolo chapéu, muito usado em imagens modificadas ou não pelos membros, uma
provável referência à distribuição GNU/Linux Red Hat, largamente usada em servidores
Web e, de certa forma, responsável direta pelo sucesso de programas de código-fonte aberto
nessa área.
        Diante das postagens do grupo Citrix XenServer no período delineado para este
estudo, verificou-se uma dinâmica que apresenta características específicas em relação às
trocas comunicativas. Desse modo, percebeu-se a constituição de conversas coerentes
com o objetivo comum do grupo, em que os membros se manifestam, entram e saem, mas
sem quebrar o fio condutor das conversas. Assim, constatou-se que não é habitual para
esse grupo específico postar instruções ou comentários que não estejam relacionados ao
assunto principal, ou seja, à virtualização de servidores. Um exemplo são as imagens, os
vídeos ou os links que aparecem em conjunto com a explicação do que foi postado e quase
sempre estão coerentes com as conversas no grupo.
       Interessante perceber que a escolha do Telegram, em detrimento das comunidades
ambientadas nas chamadas redes sociais, por exemplo, tem uma razão de ser. O modelo
de interação do Facebook, por exemplo, está baseado em informações dispersas. O
Facebook enfatiza o que está acontecendo no momento, dificultando a recuperação de

6
  A aplicação-cliente, ou seja, o programa usado pelos usuários tem seu código-fonte disponível e pode ser
  alterado de acordo com as necessidades dos usuários. No entanto, os serviços ao lado do servidor estão
  com o código-fonte fechado e é proprietário.
7
  Navegadores. Programas usados para a navegação entre páginas na internet.
8
  Sistema operacional de código-fonte aberto.
9
  Computadores que fornecem serviços de rede e internet.


                                                                                                       73
postagens antigas; por ter o código fechado, não é possível entender os critérios que os
algoritmos de busca e relevância utilizam, impedindo adaptações e comprometendo o
engajamento em torno de um tema. Outra diferença clara é o modo como a rede social
Facebook se organiza: os usuários são incentivados a postar “tudo e qualquer coisa”,
rompendo o foco.
       Nessa perspectiva, Santaella (2013, p. 88) afirma que
                       [...] a grande maioria das pessoas vive tomada por um frenesi, na ansiedade de
                       atualizar ininterruptamente suas entradas nas redes, uma ansiedade estimulada
                       pelas facilidades que as mídias móveis, companheiras inseparáveis dos usuários,
                       apresentam.
         Assim, geralmente, ao se ver uma foto ou um link no Facebook, não se espera
uma explicação, podendo ser uma informação fugaz, que muito rapidamente é substituída
por outra, de outro “amigo”, provavelmente sem nenhuma relação com a anterior, mesmo
em sua ferramenta de grupos. Abre-se, curte-se ou não e se passa para a próxima. No
Telegram, em contrapartida, além de haver funções que facilitam o foco da conversa, como
uma busca de fácil acesso, a conversa pode fluir em torno de um único tema, sem muitas
distrações.
       A seguir, far-se-á uma explanação mais específica acerca da interatividade na
cibercultura e como esse processo vem reconfigurando a atuação do usuário em rede.

4. Interatividade na cibercultura
Enquadra-se, portanto, a cibercultura em tal contexto como a materialização de um
movimento social marcado pelo fluxo de informações. Em espaços como o grupo Citrix
XenServer, no Telegram, a educação ganha continuidade a partir da interação de sujeitos
que se reconhecem como colaboradores da produção do conhecimento em rede, dotados
de discernimento das qualidades e das possibilidades profícuas do fluxo intenso de
informação no contexto comunicacional da contemporaneidade. Sujeitos conscientes de
que há para todos uma posição como agentes ativos na constituição dessa teia, dessa rede
de processos comunicacionais e sociotécnicos.
        Nesses espaços, o compartilhamento de técnicas e de linguagens constrói uma
experiência coletiva de inteligência, desenvolvendo-se em uma perspectiva de
construções mútuas. A inteligência coletiva se torna o ponto essencial nas experiências
sociais no ciberespaço, convergindo competências e ideias. O conceito de cibercultura
está interligado, então, com alguns outros conceitos orientadores no dimensionar de suas
dinâmicas.
        Já o conceito de rede se associa a uma arquitetura de estrutura dinâmica e aberta,
uma formação de nódulos que age sobre uma trama, modificando-a e por ela sendo
modificada. Nessa rede, cada nó corresponde a uma pessoa, que, ao se reconhecer como
protagonista da constituição dessa trama, potencializa-se na condição de autor de sentidos
e informações. É uma estrutura em que múltiplos interagentes se encontram em interação,
movimento e conexão, consoante Moraes (1997). Nesse sentido, de acordo com Teixeira
(2010, p. 31):
                       Sua função básica é dar suporte ao estabelecimento de relações
                       comunicacionais e colaborativas entre seus nós, entendidos como qualquer
                       elemento que possa integrá-la num determinado momento a fim de completar




                                                                                                  74
                       algum significado ou sentido no processo corrente, independentemente de
                       pertencer anteriormente ao emaranhado comunicacional.
        Desse modo, já se pode compreender, diante da abordagem de Lemos (2003), a
significância dos princípios da cibercultura, quais sejam, emissão (prática da autoria),
conexão (compartilhamento e trocas na rede) e reconfiguração (apropriação e autoria). A
cibercultura é compreendida também, segundo Lévy (1999), como o conjunto de técnicas,
práticas e atitudes que permeiam a comunicação no meio digital. Centrada na informação,
abrange modos distintos de pensamento, a partir de seu caráter participativo e interativo,
que se desenvolve no ciberespaço. Configura-se como um novo ambiente de comunicação
que interconecta mundialmente os computadores, estreitando o acesso às informações,
bem como a troca e a hibridação das culturas, por ser um espaço articulador que
possibilita a conexão a partir de várias formas de sociabilidade, sendo, dessa forma, um
lugar de interações sociais que ocorrem virtualmente.
        Silva (2012, p. 14) aborda ainda a interatividade na internet como uma “nova
modalidade comunicacional”, a qual acaba modificando o âmbito da comunicação, pois
permite o redirecionamento da mensagem, da emissão e da recepção, em que o internauta
“[...] manipula a mensagem como coautor, cocriador, verdadeiro conceptor”.
       Essa rede é, assim, um espaço cujas características desestabilizam a autoria
individual e favorecem uma noção de autoria coletiva, colaborativa, que, conforme Lévy
(1999), engendra a inteligência coletiva. O conceito de inteligência coletiva fornece
subsídio para a compreensão da dinâmica das redes e da constituição social do
ciberespaço. A inteligência coletiva é elemento central da cibercultura, ao se entender o
conhecimento como difuso na multiplicidade de sujeitos que o podem compartilhar e o
colocar em sinergia com a coletividade, fortalecendo a ideia de protagonismo potencial
em cada nó da rede, em cada sujeito interativo que compõe a trama da sociedade da
informação, conforme Castells (2000).
        Nesse sentido, fica evidente a renovação das configurações do todo
comunicacional, dos valores e das trocas simbólicas que ocorrem na sociedade, gerada
diante de uma atividade espontânea, descentralizada e participativa ocorrente no
ciberespaço, ambiente interativo, vivo e inacabado que suscita uma comunicação
articulada, sem um sistema unificador.
        Adiante, abordar-se-á também como ocorre a aprendizagem em rede a partir das
trocas comunicativas decorrentes do grupo foco deste estudo.

5. A aprendizagem em rede e as trocas comunicativas do grupo XenServer
O modo como se desenvolvem as trocas no grupo pesquisado é um aspecto fundamental
para a construção da aprendizagem de seus integrantes. Constituídas de muitos termos
técnicos, as trocas comunicativas, que, como foi observado, têm como propósito a
construção de conhecimentos específicos, parte de indagações dos membros, a fim de
sanar suas dúvidas comuns acerca de temas relacionados ao programa XenServer. Os
membros do grupo compartilham explicações sobre algum tema relacionado. As dúvidas
suscitadas geralmente envolvem problemas técnicos, mas podem ocorrer interações
correlatas, como trocas de experiências no mercado de informática.
       Como retratado, destacou-se o processo comunicativo de dois integrantes do
grupo para as análises mais específicas, seguindo alguns parâmetros, como o maior índice
de atuação desses dois integrantes no desenvolvimento dos diálogos que orientam a

                                                                                           75
construção de aprendizagem entre os membros do grupo. A partir do momento que esses
sujeitos respondem aos questionamentos feitos de maneira coerente e explicativa,
apresentando instruções, a fim de solucionar o problema de alguém, geram fluxos de
interações entre outros participantes, suscitando outras situações, como depoimentos de
suas práticas, o que enriquece as trocas de saberes.
       As trocas comunicativas ocorrem de maneira sistemática e acontecem em situações
diversas, como trazer dúvidas e fazer questionamentos sobre um fator específico e restrito à
temática de discussão do grupo. Os discursos são encaminhados de diversas maneiras:
imagens, links e textos, ora longos, ora curtos, usando uma linguagem que é entendida pelos
membros do grupo. Diante disso, o The New London Group (1996) aborda que
                        Os novos canais multimídia e hipermídia podem e às vezes fornecem a membros
                        de subculturas a oportunidade de encontrar suas próprias vozes. Essas tecnologias
                        têm o potencial de permitir uma maior autonomia para os diferentes mundos da
                        vida.
        Representa, dessa forma, uma prática linguística estruturada por vias diversas de
comunicação, dado que a linguagem é usada de diferentes maneiras nesse aplicativo, a
depender de suas possibilidades de expansão no processo comunicativo, sendo
constituída por elementos que vão desde explicações longas acerca de algum assunto
específico até imagens para reforçar o que já foi explanado, ou mesmo no sentido de
explicar com mais clareza algum procedimento, a fim de ilustrá-lo. Fica evidente, assim,
a diversidade linguística nessa interface digital.
       Desse modo, destaca-se adiante a participação mais ativa dos dois membros já
citados, que se manifestam e constroem a prática comunicativa em que são usadas
diversas linguagens, incluindo multimídia, comuns aos integrantes do grupo, “articulados
com posições especiais do assunto”, como também com diferentes maneiras, consoante o
The New London Group (1996). No caso destacado abaixo, evidencia-se um diálogo em
que o usuário se direciona a outro participante para chegar a uma solução acerca de seus
questionamentos por meio de uma captura de tela, objetivando facilitar o caminho para a
solução procurada.




                                           
      Depreende-se, assim, que, nesse aplicativo, estão presentes as linguagens
chamadas multimidiáticas, abrangendo certa variabilidade na transposição das


                                                                                                     76
informações, com unidades de som, imagens, áudios e links. Nesse processo interativo, é
presente também a evidência de explicações complementares às demais já apresentadas,
inclusive entre os dois usuários destacados, para refinar esta análise, um ensejo para a
construção de diálogos entre outros participantes também, fato que acaba por integrar os
membros de um grupo. Assim, mesmo que não exista moderação oficial no grupo,
percebe-se que esses participantes assumem a conduta de moderadores.
        A seguir, na imagem adiante, apresenta-se uma das conversas que serve para
ilustrar esse processo de interatividade que se dá entre os membros do grupo e para
demonstrar como atuam, de modo que haja um estímulo para que outros participantes se
envolvam na discussão.




                                       
       Nesse sentido, Santaella (2013) afirma que a comunicação em rede ocorre diante de
compartilhamentos sob uma perspectiva “midiática e pervasiva”. O processo de escrita é um
marco destacável no meio digital, e os usuários se apropriam dos múltiplos recursos que os
programas e aplicativos os oferecem, sendo, pois, evidenciadas as contribuições do uso das
tecnologias na prática comunicativa.
       As perspectivas das tecnologias digitais chancelam a escrita em um processo
colaborativo. Nesse sentido, Fiorentini (2004, p. 52) reforça esse pensamento e esclarece
que
                        Na colaboração, todos trabalham conjuntamente (co-laboram) e se apoiam
                        mutuamente, visando atingir objetivos negociados pelo coletivo do grupo. Na
                        colaboração, as relações, portanto, tendem a ser não-hierárquicas, havendo
                        liderança compartilhada e co-responsabilidade pela condução das ações.
        No caso dessa observação, os usuários, formados em um grupo colaborativo,
integram-se na predominância da interação e da negociação e no compartilhamento das
ideias para a construção do conhecimento específico abordado nas interações.
        O grupo é focado no software Xen; em torno dele, várias subseções vão sendo
discutidas. A maior ocorrência é a solução de problemas específicos; as exceções que
ocorrem no funcionamento do programa fazem que os fatos não aconteçam como o
esperado. Rapidamente, os usuários investigam o caso, conversam entre si, resgatam
casos semelhantes, simulam o problema em seus ambientes e postam os resultados. Dessa


                                                                                                77
forma, agindo interativamente, uma discussão se forma em torno da questão, fornecendo
caminhos e sugestões que irão solucionar o problema relatado. Quando isso acontece,
todos tiram proveito da experiência e enriquecem sua base de conhecimento.
        Os termos usados nessas interações são bem característicos da realidade
profissional de seus integrantes. São jargões do dia a dia dessas pessoas. Mesmo
abreviaturas de termos técnicos, signos que aparecem em forma de imagens, como
emoticons ou memes, são familiares e funcionam como linguagem particular no contexto
do grupo, os quais são entendidos por todos os participantes.
      Assim, a fundamentação das conversas ocorrentes entre esses usuários torna-se
um processo contínuo, socialmente construído. No caso desta vivência, a figura do autor
deixa de ser centralizada. Essa interconexão propiciada pelas tecnologias digitais
emancipa o usuário escritor de maneira vasta e multiforme na busca pelo conhecimento.
         Nesse contexto, Dillenbourg (1999, p. 8, traduziu-se) afirma que: “[...] na
colaboração, os parceiros fazem o trabalho juntos”. Isso significa que os integrantes não
apenas conversam, mas se envolvem nas etapas do processo colaborativo, e esta ação
facilita o processo de aprendizagem.




                                  
        Nesse caso, percebe-se a presença marcante de opiniões complementares, que se
destacam nesse grupo pela atuação participativa nos diálogos, uma característica marcante
da escrita colaborativa, pois há a integração de saberes entre os usuários, não limitando a
comunicação entre apenas alguns membros, e sim envolvendo todos nesse processo
comunicativo.
        Nessa perspectiva, Santaella (2013) aborda que, diante dessa integração, há uma
“construção coletiva de saberes” a partir das redes de cooperação mútua, em que os
membros do grupo “fazem coisas e resolvem problemas juntos”. Dessa forma, pessoas com
interesses comuns a um propósito se conectam e se aproximam, a fim de colaborar umas
com as outras e encontrar soluções viáveis para questionamentos afins.




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6. Dinâmica de ação e semelhanças com as comunidades de prática
As práticas comunicativas do grupo Citrix XenServer fornece indícios que apontam para
a formação semelhante à de uma comunidade de prática, do modo como é proposto por
Wenger (2001), uma rede informal definida como um conjunto de pessoas que
compartilham um interesse, elaboram um conjunto de problemas sobre assuntos
específicos e aprofundam seus conhecimentos e expertise na área pela interação regular.
O aplicativo Telegram é, então, uma ferramenta que auxilia a atividade desse grupo no
ciberespaço, possibilitando a aprendizagem social na rede.
        As comunidades de prática possuem características próprias, um domínio de
interesses comuns que delimita as fronteiras do grupo, sua área de atuação, nas quais os
participantes compartilham esses interesses e ajudam uns aos outros, criando vínculos e
trocando conhecimentos que tratam do domínio de importâncias afins do grupo. Esses
membros, por meio da interação, compartilham suas práticas e seus problemas comuns
em um processo de aprendizagem social.
        Essas características são, em muitos momentos, encontrados no grupo Citrix
XenServer. Isso se torna evidente quando se observam as conversas e mesmo a
denominação do grupo, em que o domínio gira em torno do software de virtualização
Xen. Mesmo que sejam citadas outras alternativas de softwares em alguns momentos,
isso se dá apenas como comparativo ou como uma busca de replicar uma função ou tarefa
ainda não presente no Xen, mas que já foi implantada por outros. Além do domínio
comum, as comunidades de prática possuem outras características fundamentais. A
própria prática comum dará munição e respaldo às participações, criando, por fim, uma
comunidade na qual as trocas serão feitas. Desse modo, concebe-se um senso de
pertencimento e identidade comum aos membros do grupo, o qual, mesmo não sendo
uniforme, abrange a maioria dos membros ativos e é construído a partir de interações
regulares, com o objetivo de constituir os vínculos.
       No grupo estudado, há uma variedade de situações; mesmo em torno de um tema
comum, podem-se constatar complexidades. Experimentos, testes, revisões e sugestões é
que fazem o grupo ganhar em performance e enriquecer sua base de conhecimentos.
Mesmo não tendo moderadores oficiais, alguns membros acabam por atuar de forma
semelhante àqueles que têm um papel definido de organizadores do grupo. Características
como reconhecimento da competência do outro, confiança adquirida além das relações
hierárquicas e mediação solidificam a reputação a partir do nível de participação.
        Esses membros mais ativos conhecem o ambiente, sabem do que os demais
membros precisam, conhecem a prática do grupo e as potencialidades dos recursos
tecnológicos, são pontos de apoio e compreendem quando devem intervir, encorajando a
troca de experiências. Apesar do destaque desses usuários, não há impedimento que esse
papel seja assumido por algum novo participante, já que a reputação é construída a partir
do nível de participação, proporcionando uma discussão para além das relações
hierárquicas.

7. Considerações finais
Com o desenvolvimento deste estudo, concluiu-se que não há uma hierarquia clara na
comunidade Citrix XenServer, mas a dinâmica do grupo aponta para o papel fundamental
da moderação, especialmente em se tratando da proposta do grupo.



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        O estudo destaca uma aproximação da ação do grupo semelhante ao que ocorre
em uma comunidade de prática. Mas essas semelhanças não são suficientes para afirmar
que se trata de uma, principalmente quando observamos a formação e o desenvolvimento
do grupo. Não houve, por exemplo, uma intenção inicial em se criar uma comunidade de
práticas, sua origem está na iniciativa de expandir conhecimentos sobre o XenServer em
um nível mais avançado, fugindo dos ruídos geralmente encontrados em fóruns abertos.
Acompanhando as trocas e a dinâmica do Citrix XenServer no Telegram, pôde-se
constatar uma eficácia no objetivo do grupo: a de fazer que a troca de experiências no
ciberespaço se convertesse em novos aprendizados.
       Embora não explorado no texto, o grupo pode ser pensado ainda sob a luz do
conectivismo, sobre o qual Siemens (2003) aponta os principais conceitos. Como o
conhecimento é construído por meio de redes de conexões, a aprendizagem, então, é a
capacidade de construir conhecimento em conexão. Suas reflexões levantam questões
importantes para quem deseja compreender como se dão as trocas de saberes no
cibermundo.
      Como constatado, é a troca de saberes em rede que fundamenta e dá sentido à
comunidade pesquisada. Assim, ao aprofundar a questão da aprendizagem, pode-se lançar
mão das contribuições do conectivismo como um caminho para entender esses processos
em grupos e comunidades como a estudada.
        As observações realizadas nesse grupo do Telegram permitiram identificar como
se dá a discussão da prática de escrita coletiva dentro do contexto de ensino-aprendizagem
em rede. Nessa perspectiva, foram observadas diferentes práticas que se explicam pelos
modos distintos de interação entre os membros do grupo. Sendo assim, a aprendizagem
em rede que se dá nesses jogos de comunicação supõem relações estabelecidas entre os
atores do grupo.
        Foram vistos também outros aspectos relevantes no decorrer das observações para
a fundamentação desta pesquisa, como a parceria entre os membros do grupo; o
envolvimento e a participação na interação no ciberespaço; o incentivo para a construção
de diálogos entre os participantes; a existência de elementos que evidenciam a
interatividade e as relações harmônicas no meio digital; e a integração de conhecimentos
na construção colaborativa. Portanto, diante das análises aqui postas, pôde-se constatar
que a comunidade pesquisada segue um propósito específico acerca de suas trocas
comunicativas.

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