=Paper= {{Paper |id=Vol-1667/CtrlE_2016_AC_paper_25 |storemode=property |title=As Tecnologias da Informação e Comunicação na Expansão das Capacidades: Reflexões em torno da experiência docente no estado do Rio Grande do Norte |pdfUrl=https://ceur-ws.org/Vol-1667/CtrlE_2016_AC_paper_25.pdf |volume=Vol-1667 |authors=Sylvana Kelly Marques da Silva,Anna Gabriella de Souza Cordeiro }} ==As Tecnologias da Informação e Comunicação na Expansão das Capacidades: Reflexões em torno da experiência docente no estado do Rio Grande do Norte== https://ceur-ws.org/Vol-1667/CtrlE_2016_AC_paper_25.pdf
As Tecnologias da Informação e Comunicação na Expansão
das Capacidades: Reflexões em torno da experiência docente
            no estado do Rio Grande do Norte

           Sylvana Kelly Marques da Silva¹, Anna Gabriella de Souza Cordeiro²
     ¹
     Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade
     Federal do Rio Grande do Norte. Natal/ Brasil. E-mail : sylvanakelly@gmail.com
²
    Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
       Rio Grande do Norte. Natal/ Brasil. E-mail : gabriellacordeiro@hotmail.com


         Resumo. É consenso que as Tecnologias da Informação e Comunicação –
         TIC’s – transformaram diferentes âmbitos da vida humana, são novas
         experiências e propostas atreladas às temporalidades e espacialidades que
         emergem na sociedade informacional. Em busca da construção de
         alternativas para estimular o interesse no uso criativo das TIC’s, uma vez que
         o Estado vem implementando diversos programas que objetivam desenvolver
         seu uso na esfera educativa, é que apontamos para o nível de integração dos
         docentes de regiões periféricas no estado do Rio grande do Norte com as
         novas TIC’s. Para tal, nos apoiamos no conceito de desenvolvimento como
         liberdade de Amartya Sen (1993), esse tem como pilar de sustentação a
         expansão de capacidades que nos serviu enquanto instrumento de avaliação
         da efetividade do aproveitamento dessas tecnologias. Caracterizamos a
         efetivação enquanto o processo de integração dos profissionais com as TIC’s
         e a avaliamos por meio da Dinâmica de Grupo Focal e Observação Direta.
         Evidenciou-se, de acordo com a perspectiva do autor referenciado neste
         trabalho, que não houve a expansão das capacidades, visto que a integração
         dos docentes com as TIC’s não acompanhou as práticas fomentadas pelas
         propostas em que estão inseridas as novas tecnologias da informação
         atreladas à educação.
         Abstract. Is a common sense that the Information and Communication
         Technologies – ICT’s – has been transformed different aspects of human life,
         are new experiences and proposals related to the temporality and spatiality
         that emerge in the information society. In search of alternatives to stimulate
         interest in the creative use of ICT’s, since the State has been implementing
         various programs to develop its use in the educational area, it is that our goal
         to analyses the integration level of teachers to the peripheral regions in the
         state of Rio Grande do Norte with the news ICT’s. In order to do that we rely
         on the concept of development as freedom of Amartya Sen (1993), this has the
         support pillar expansion capabilities that served as the evaluation tool of the
         effectiveness of the use of these technologies. Characterized the effectiveness
         as a process of integration of professionals with ICT’s and analyzed through
         the Focus Group Dynamics and Direct Observation. It was evident the
         according to the author's perspective that there was no expansion of capacity,


                                                                                            101
     since the integration of teachers with ICT did not follow the encouraged
    practices by proposals in which they operate the new technologies related
    information to education.

1. Introdução
No século XX, mais do que em qualquer outro período, foi observada uma tendência
contínua e acelerada de mudança tecnológica sobre praticamente todos os campos da
experiência humana. Das tecnologias desenvolvidas no século passado as da informação
e comunicação marcaram uma reconfiguração no cenário histórico-social. Foi
vivenciada, no período em questão, uma reestruturação global do sistema capitalista de
produção. Sistema este que se caracteriza, primordialmente, por suas contradições.
        Desde a invenção do telégrafo até as redes eletrônicas a sociedade experimentou
transformações extraordinárias, como a supressão das distintas fronteiras e a dispersão
espacial, gerando espaços e tempos individuais na vida social, desembocando no que o
geógrafo norte-americano David Harvey (1992) conceitua por compressão espaço-
temporal. São mudanças que fortalecem, sobremaneira, o sistema capitalista de
produção, o modelo de vida urbano e os bens de consumo individualizados e
distribuídos em um mercado global. Atualmente, é senso comum a afirmação que se
vive hoje em um mundo global, onde a conectividade criou uma coisa só. Mas, basta um
olhar crítico, para concluir que isso não é real. No entanto, entende-se que as
tecnologias da informação e da comunicação estão provocando significativas alterações
em distintas esferas da vida humana, mas não de maneira global. É evidente que essas
ferramentas vêm colaborando para a modificação do planeta e das relações humanas,
mas não de forma igualitária (SEVCENKO, 2012).
       As alterações ocorridas, de um modo geral, foram propiciadas pelo uso das
ferramentas tecnológicas no interior do sistema de produção capitalista, com o objetivo
de ampliação do lucro, de expansão e de internacionalização de tudo o que tem valor
econômico. Ou seja, são mecanismos intrínsecos de acumulação do capital em prol de
um desenvolvimento que está vinculado às abordagens economicistas (MORAN, 1995).
        Como o capitalismo é um sistema contraditório, que visa majoritariamente o
lucro, as tecnologias em questão viabilizam novas formas produtivas e permitem a
expansão na busca de novos mercados, tendo em vista maiores faturamentos que
canalizam seus benefícios aos países tidos como desenvolvidos; fomentam estruturas de
exploração predatória; desestabilizam economias e aumentam os abismos financeiros
(SEVCENKO, 2012).
       Contudo, de acordo com um grupo significativo de teóricos (CASTELLS, 2006;
LATOUR, 1994; SEVCENKO, 1992) o sentimento de otimismo, com os aparatos
tecnológicos, que se projetaram principalmente no campo do progresso e da ciência,
baseados no mito do progresso, logo dão lugar a um novo ideal chamado de
desenvolvimento, baseado no modelo socioeconômico de alguns países da Europa e nos
Estados Unidos que se transformaram em um padrão a ser seguido pelo que foi
denominado por países subdesenvolvidos (HEIDEMANN, 2010).
       Quanto aos países considerados subdesenvolvidos, o desenvolvimento refere-se
ao aumento dos níveis da capacidade produtiva, de industrialização, do consumo e do
uso das tecnologias. Nesse contexto, torna-se necessário que esses países periféricos


                                                                                   102
busquem alcançar o desenvolvimento. O ideal de desenvolvimento se amplia,
principalmente, após o segundo grande conflito mundial quando o presidente Truman,
em 1949, toma a frente do governo dos Estados Unidos e introduz o conceito de
desenvolvimento e subdesenvolvimento. No Brasil da Era de Juscelino Kubitschek ao
Brasil dos Militares o país é recortado por decisões políticas e programas que
vislumbraram o desenvolvimento com base na industrialização e na dotação de
tecnologias.
        Todavia, no sistema capitalista de produção não existe uma lógica capaz de
diminuir os conflitos socioeconômicos e gerar uma distribuição equitativa do capital.
Nas regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos, as diferenças socioeconômicas
são ainda mais significativas. O que gera um contraste em relação aos grandes centros,
que por sua vez atuam na lógica da dinamização econômica, levando em conta a
diversificação das atividades e das fontes de renda que o envolvem por meio do uso de
diferentes aparatos tecnológicos.
       No século XX, inscreve-se um contexto socio-histórico de importantes
modificações estruturais, no qual, destaca-se o papel crescente das chamadas
Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC’s). Um período político e
ideológico, marcado pela guerra fria, que tem como estopim o progresso eletrônico
(MATTELART, 2006). A influência da tecnologia é tão marcante, em nossos dias, que
se desdobrou em conceitos que buscam caracterizar nossa vivência sob uma nova
sociedade pós-industrial, chamada de sociedade informacional ou Sociedade da
Informação (CASTELLS, 1999).
       As constantes transformações tecnológicas que acometeram a sociedade
contemporânea, principalmente após a revolução digital, provocaram significativas
mudanças nas relações de produção e nas formas de sociabilidade humana. As novas
tecnologias possibilitam o processamento, compressão, armazenamento e comunicação
de grandes quantidades de dados, em diversos formatos, como texto, imagem e som, em
curto prazo de tempo, e entre usuários localizados em qualquer lugar do mundo.
Interconectando os indivíduos em diferentes espaços e em tempo real.
        Dentre os diferentes usos que as novas TIC’s possibilitam está à melhoria da
educação. Porém, ao mesmo tempo em que diversas fronteiras foram reduzidas, o
acesso as TIC’s ainda continua sendo uma realidade distante para uma grande parcela
da população mundial. Tanto pela dificuldade em acessar os equipamentos e a
conectividade, quanto pela ausência das habilidades necessárias para utilização desses
equipamentos, ocasionando uma nova forma de desigualdade social: a desigualdade
digital. No caso do Brasil, o governo vem a mais de duas décadas implementando
programas de informação e inclusão digital na área educacional, visando utilizar
pedagogicamente as novas TIC’s a partir da capacitação dos professores para promover
mudanças positivas nos ambientes educativos (SILVA, 2010).
        A fim de mensurar essa realidade, procurou-se mostrar como o conceito de
expansão de capacidades um dos pilares para o desenvolvimento como liberdade (SEN,
2000) relaciona-se a constituição de habilidades ao acesso do uso potencial das
tecnologias da informação e da comunicação. Isso em prol de um conhecimento que
seja efetivamente compartilhado por todos em um movimento produzido no sentido do
desenvolvimento como liberdade. O papel atribuído à educação, se pensado na



                                                                                  103
tendência da Pedagogia Libertadora proposta por Paulo Freire e da Pedagogia Critico-
Social1 está em consonância ao papel do desenvolvimento proposto por Sen (2000).
Visto que ambas as teorias se coadunam a possibilidades de ação e reflexão sobre a
realidade2 no processo de ensino e aprendizagem.
         Como campo de estudo foram escolhidos oito municípios do estado do Rio
Grande do Norte. O estado há quase duas décadas participa dos programas de
capacitação de professores para o uso das TIC’s extendendo o incentivo aos municípios,
um dos exemplos mais significativos é o da atuação do ProInfo – Programa Nacional de
Tecnologia Educacional, que inicia em 1997, com a promoção do uso pedagógico da
informática na rede pública de educação3 (SILVA, 2010). Os professores escolhidos
atuam em zonas periféricas, onde se acredita existir maior relação dos indivíduos com o
próprio ambiente que o circunda, visto que a influência do capital e das próprias
tecnologias se dá em ritmo menor. Nesses espaços acredita-se apreender as tensões em
uma escala ainda menor de subjetividades, facilitando a compreensão, a análise e a
crítica socioespacial.
        Para a realização deste estudo adotou-se como metodologia a dinâmica do grupo
focal4 e a observação direta com os docentes da educação básica da rede pública de oito
municípios do estado; ainda, o confronto e as mediações necessárias entre a bibliografia
escolhida, que discorre sobre a temática das tecnologias da informação e da
comunicação, desenvolvimento, educação, efetividade, expansão das capacidades e do
desenvolvimento como liberdade. A partir desse âmbito construiu-se uma ponte entre a
teoria e a prática para à articulação das impressões que conseguimos captar em campo
por intermédio dos professores.
       Ao final da análise, de acordo com a percepção do conceito que nos guiou, não
houve a expansão das capacidades, visto que a integração dos docentes com as TIC’s
não acompanhou as práticas fomentadas pelas propostas em que se inserem as novas
tecnologias da informação atreladas à educação.

2. As Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC’s) e a
Sociedade Contemporânea
É consenso que as tecnologias da informação e comunicação – TIC’s – estão
transformando, sobremaneira, diferentes âmbitos da vida humana, são novas práticas e
1
  A Pedagogia Critico-Social toma partido dos interesses sociais, atribuindo à instrução e ao ensino o
papel de proporcionar o domínio de conteúdos científicos, métodos de estudos, habilidades e hábitos de
raciocínio cientifico de modo a irem formando a consciência crítica faca às realidades sociais. E, mais,
capacitando o indivíduo a assumir no conjunto das lutas sociais a sua condição de agentes ativos de
transformação da sociedade e de si próprios. (LIBÂNIO. 2013 p. 74)
2
  A conscientização é o encontro com a realidade. Quanto mais consciente, mais se reconhece a realidade,
mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por
esta mesma razão, a conscientização não consiste em “estar frente à realidade” assumindo uma posição
falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação –
reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o
mundo que caracteriza os homens. (FREIRE, 2001. p 30)
3
  O Proinfo foi criado em 9 de abril de 1997 pelo Ministério da Educação, através da Portaria Ministerial
nº 522/97.
4
  O grupo focal é uma técnica que consiste na reunião de pessoas objetivando a coleta de informações.
Nos baseamos no discurso de 09 (nove) estudantes do Ensino fundamental I, que compreende as séries
que do 2º ao 4º ano com atuação do Proinfo, na Escola Municipal Pedro Fernandes.


                                                                                                    104
representações atreladas às temporalidades e às espacialidades que emergem na
sociedade informacional.
         Mas, por sua vez, cabe indagar o que se pode entender por tecnologias, já que se
tem aqui por objetivo problematizar as novas tecnologias de informação e comunicação,
entender o seu contexto-histórico, os conceitos que envolvem as TIC´s, conhecer as
ferramentas que fazem, ou que podem vir a fazer, parte de seu escopo. Para isso, faz-se
necessário compreender que essas ferramentas, por serem construídas por seres
humanos, são carregadas de conteúdos ideológicos e de interesses. Ou seja, de modo
algum, as mensagens que elas passam devem substituir o entendimento humano, social
e crítico que o próprio indivíduo deve fazer da sua época.
        Tal época, fim do segundo milênio da Era Cristã, se caracterizou pelo modo
acelerado e pela reconfiguração do cenário social devido aos vários acontecimentos de
importância histórica, principalmente pelo advento da tecnologia informacional. Ou
seja, foi possível observar uma ruptura marcante na continuidade histórica, em que
houve a reestruturação global de um sistema de produção, o capitalista, para o qual o
avanço da tecnologia informacional foi uma ferramenta básica, que permitiu maior
flexibilização de gerenciamento, descentralização das empresas com organizações por
meio de redes, declínio dos movimentos dos trabalhadores, individualização e
diversificação das relações trabalhistas, incorporação das mulheres na força de trabalho,
majoritariamente, em situações discriminatórias (Albuquerque Júnior, 2009), aumento
da concorrência econômica global, intervenção estatal para desregulamento dos
mercados e desmonte do Estado do bem-estar social com diferentes intensidades e
orientações, dependendo da natureza das forças e instituições políticas de cada
sociedade; aumento da concorrência econômica global em um contexto de progressiva
diferenciação dos cenários geográficos e culturais para a acumulação e a gestão de
capital, entre outras ações que favoreceram a acentuação de um desenvolvimento
desigual.
        Nesse cenário, as redes interativas de computadores cresceram
exponencialmente, criando novas formas e canais de comunicação, moldando a vida e,
ao mesmo tempo, sendo moldadas por ela. As mudanças ocorridas no âmbito social são
tão drásticas quanto os processos de transformação tecnológica e econômica. As redes
sociais globais conectam e desconectam indivíduos, grupos, regiões e países, em
pertinência com os objetivos processados no fluxo de decisões estratégicas abstratas ou
de identidades particularistas historicamente enraizadas. Estruturando assim uma
bipolaridade entre a Rede e o Ser (CASTELLS, 1999).
        Contudo, a tecnologia não determina a sociedade e nem a sociedade escreve o
curso da transformação tecnológica, mas a tecnologia acaba sendo incorporada pela
sociedade que a utiliza, por diferentes fatores que ela agrega. Dentre esses fatores,
podemos pensar nas diferentes iniciativas que surgem em rede, distintas criatividades e
inovações tecnológicas com aplicações sociais que terão seu resultado final dependentes
de um complexo padrão interativo. Pode-se citar, como exemplo de consequências
sociais involuntárias, a Internet. A Internet foi fomentada com o objetivo de impedir a
tomada do sistema norte-americano de comunicações pelos soviéticos, em caso de
guerra. Todavia, resultou em uma rede apropriada por indivíduos e grupos no mundo
inteiro, com diferentes objetivos. Mas, sem dúvida, a habilidade ou inabilidade das
sociedades dominarem as tecnologias faz com que direcionem o uso de seu potencial


                                                                                     105
tecnológico em diferentes contextos, incorporando significativas transformações sociais
(CASTELLS, 1999).
        Para o entendimento, acerca das transformações ocorridas no contexto da
sociedade informacional, outro conceito é de fundamental importância, o conceito da
técnica, importante até para o entendimento da própria contemporaneidade e que ambas,
técnica e tecnologia, não se confundam. A técnica é o procedimento, ou, o conjunto de
procedimentos que têm como objetivo obter um determinado resultado, que pode ser no
campo da ciência, da tecnologia, das artes, da política etc. (LOCATEL; AZEVEDO,
2011).
         Etimologicamente, a palavra técnica, de origem grega (τχνη), significa arte, ou
seja, meio de fazer. No dicionário Michaelis, da língua portuguesa, podemos observar
que técnica significa também conhecimento prático; um conjunto de métodos e
pormenores práticos essenciais à execução perfeita de uma arte ou profissão. Nesse
sentido, a técnica emerge das relações humanas com o seu meio e se caracteriza por ser
consciente, reflexiva, inventiva e fundamentalmente individual. Tecnologia, por sua
vez, significa à sistematização científica dos conhecimentos relacionados à técnica, ou
seja, a tecnologia não se confunde com a técnica, pois a primeira seria uma meta-técnica
por possuir a técnica como objeto de seus estudos e aplicação. A palavra tecnologia
também tem origem grega (do grego τεχνη – “ofício” e λογια – “estudo”) e é um termo
que envolve o conhecimento técnico e científico e as ferramentas, processos e materiais
criados e/ou utilizados a partir de tal conhecimento. Dizendo de outra maneira,
tecnologia pode ser entendida como a aplicação dos conhecimentos científicos à
produção em geral ou para se obter um resultado prático (LOCATEL; AZEVEDO,
2011).
        Nesse aspecto, Castells ressalva que a tecnologia modifica a sociedade e seus
costumes, havendo, deste modo, uma interação mútua que é sintetizada pela máxima “a
tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas
ferramentas tecnológicas” (Bijker et al. apud Castells, 1999, p. 43). Então, pode-se
assim entender a tecnologia como uma ferramenta incorporada pelo homem à sociedade
e intrinsecamente ligada aos aspectos temporais, espaciais e culturais. O que ocasiona
novas relações entre os homens, o espaço e a natureza.
        De acordo com Castells (1999), ao mesmo tempo em que a sociedade se
apropria das tecnologias descobre novas formas de conhecimento para a criação de mais
conhecimento e de mais informação, uma lógica onde a tecnologia e o conhecimento se
retroalimentam, acumulando mais conhecimento e informação. Nesse aspecto, a
sociedade contemporânea está sendo remodelada por intermédio de uma intensa
revolução tecnológica que tem como ferramenta primordial as tecnologias da
informação. E, tem se processado em ritmo acelerado e por toda parte, construindo
novos contornos entre a economia, o Estado e a sociedade.
        Em âmbito econômico, emergem sistemas em rede profundamente
interdependentes que se tornam cada vez mais capazes de aplicar seu progresso em
tecnologia, conhecimento, produtividade, lucratividade e competitividade. Em suma, a
economia informacional, com capacidade de funcionar em tempo real, em escala global,
intensificando as relações sociais, usando como ferramenta primordial as novas
tecnologias, dentre elas a internet. Trata-se, portanto, de uma economia informacional e



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global que, na perspectiva de Castells (1999, p. 93), apresenta as seguintes
características: É informacional porque a produtividade e a competitividade das
unidades ou agentes desta economia (quer sejam empresas, regiões ou nações)
dependem fundamentalmente da sua capacidade de gerar, processar e aplicar com
eficácia a informação baseada no conhecimento. É global porque a produção, o
consumo e a circulação, assim como os seus componentes (capital, mão de obra,
matérias-primas, gestão, informação, tecnologia, mercados) estão organizados em escala
global, seja de forma direta, seja mediante uma rede de vínculos entre os agentes
econômicos. É informacional e global porque, nas novas condições históricas, a
produtividade gera-se e a competitividade exerce-se por intermédio de uma rede global
de interação.

3. Desenvolvimento como Liberdade: Entre Privações e Expansões
Nos países considerados subdesenvolvidos as TIC’s têm tido grande expansão,
majoritariamente, com os celulares, mais recentemente, com os computadores e a
internet. Na mesma medida em que aumenta o número de usuários e a necessidade de
uso, a tecnologia vai criando uma cisão entre os que têm acesso e os que não o têm, é a
chamada “exclusão digital”. O crescimento constante aliado ao aumento da relevância
da rede e a mudança de perfil de usuários deve diminuir a taxa de exclusão digital,
porém, aumentará ainda mais o fosso dos margeados do processo. Dando margem a
desigualdade digital que aparece e se configura como uma nova privação (SEN, 2000).
        A redistribuição da informação e dos meios que produzem essa informação na
sociedade informacional pode ser possível, desde que, em articulação com o sistema
educacional e com os meios de comunicação; campos que mais se beneficiaram com as
novas tecnologias. Entretanto, estudos recentes afirmam constantes injunções entre a
teoria e a prática, contradições que também podem ser observadas in loco em diferentes
espaços, principalmente, nos espaços considerados periféricos, onde grande parcela da
população se encontra privada dos elementos mínimos para desfrutar uma vida plena.
Um grande desafio para o século XXI é o de incluir contingentes ainda margeados da
população mundial para a efetiva configuração de uma sociedade do conhecimento.
Nesse aspecto, falar sobre a efetividade do uso das TICs é falar sobre a necessidade
desses usos no desenvolvimento humano.
       O debate não é recente sobre o conceito de desenvolvimento, desde o século
XIX, no Ocidente, faz parte dos temas centrais da sociedade. Foi visto primeiramente
como um processo contínuo do progresso científico e a sua aplicação técnica à
produção, com fins na acumulação de capital. Era um desenvolvimento atrelado ao
crescimento econômico e industrial e ao uso intensivo de tecnologia que surgia no
momento.
        Sobre o conceito de desenvolvimento com viés econômico Paul Singer (1982)
apresenta uma discussão em que ordena as conceituações em duas correntes, uma que
identifica crescimento com desenvolvimento, e, outra, em que ambos os conceitos são
distintos. Da primeira corrente se desprende uma análise do conceito mediante índices
explicativos do crescimento econômico, desprezando a análise do padrão de vida e bem-
estar da sociedade. Da segunda surgiu a compreensão de que o processo de crescimento
gera mudanças quantitativas e o desenvolvimento gera mudanças qualitativas.



                                                                                   107
        Além dos dois tipos de desenvolvimento designados por Singer a concepção que
prevalece está intimamente relacionada com a questão econômica, entendida como
crescimento dos meios de produção, acumulação, inovação técnica e aumento de
produtividade. Pensa-se muito mais a expansão das forças produtivas do que a alteração
nas relações sociais de produção.
       Para Sen (2000), uma concepção adequada de desenvolvimento deve ir muito
além de variáveis relacionadas à renda. O desenvolvimento deve estar relacionado,
principalmente, com a melhoria da vida que se leva e das liberdades que se desfruta. A
expansão quantitativa do Estado não garante um desenvolvimento capitalista autônomo,
autossustentável e viável em longo prazo para os indivíduos. O que gera uma sensação
de incerteza e descontrole.
        Para Amartya Sen (2000) a liberdade é um tema central na análise do
desenvolvimento, sendo um dos seus elementos constitutivos. O desenvolvimento está
relacionado com a expansão das liberdades, das capacidades sociais e da eliminação das
privações cotidianas, sejam elas: pobreza econômica, carência de serviços públicos,
assistência social, assistência médica, dentre outras. Nas palavras do autor: “[...] com
oportunidades sociais adequadas, os indivíduos podem efetivamente moldar seu próprio
destino e ajudar uns aos outros” (SEN, 2000, p. 26). A expansão das liberdades dos
indivíduos tem a ver com o desenvolvimento humano e com a condição dos indivíduos
atuarem na sociedade e escolherem os caminhos que considerados mais propícios para a
sua vida.
        Diferentes tipos de liberdade se cruzam e contribuem para uma liberdade global
do indivíduo. Das distintas liberdades que são instrumentalizadas pelo ser humano, as
consideradas elementares são: as que o tiram da pobreza; dão mobilidade a vida social;
favorecem a participação na vida política; e claro, a liberdade de expressão. O
desenvolvimento, no mínimo, deve envolver essas liberdades inscrevendo-as além da
esfera econômica, abarcando a esfera política, social e cultural.
        Os direitos à informação, à inclusão digital e à comunicação diante desse viés
são determinantes para o exercício da liberdade e contribuem para a construção de um
desenvolvimento real. O acesso informacional, nesse contexto, é considerado um fator
fundamental de ação para a expansão das capacidades dos indivíduos e para o
desenvolvimento da qualidade de vida. A esse respeito Silva (2010) pontua que as novas
TIC’s, pelo poder que tem de transformar a sociabilidade e influenciar na subjetividade
dos indivíduos, consistem em um direito do cidadão. Desse modo, os que estão sem
acesso às novas TIC’s estão margeados digitalmente. Assim, vivenciam uma forma de
privação (SEN 1993; 2000). Essa privação, no sentido dado por Amartya Sen, significa
uma falta de liberdade, pois mesmo que não haja uma carência por renda, o indivíduo
experimenta uma série de barreiras em relação ao acesso a instrumentos que são
valorizados na sociedade contemporânea, comprometendo, muitas vezes, sua interação
satisfatória com a esfera social.

4. A Educação e o Docente como mediadores da Expansão de Capacidades
As concepções que surgem com o uso das novas TIC’s têm gerado novas perspectivas
de conceber e repassar o conhecimento. A superação de seus condicionantes através das
diversas mídias eletrônicas constitui-se em uma expansão das capacidades (SEN 2000).
A ausência das condições de uso para manuseio das tecnologias limita as possibilidades


                                                                                    108
de comunicação e informação no mundo atual. Podendo ser uma barreira à participação
social, política e econômica.
        As TIC’s podem incentivar a melhoria da qualidade de vida dos docentes e
alunos de uma localidade, desde que os atores locais estejam em sintonia e dispostos a
cooperar mutuamente em busca do desenvolvimento como liberdade. Coadunamos ao
pensamento de Sen (2000) as ideias da Pedagogia Libertadora e a Crítico-social, são
orientações teóricas que se norteiam em bases similares. Principalmente, por proporem
um modo de conhecimento que possibilita a ação e a reflexão diante da realidade no
processo do ensino e aprendizagem, expandindo as capacidades dos indivíduos e
colocando-os enquanto agentes sociais, perspectivas que fazem a base do
desenvolvimento como liberdade.
       Escolhemos como lócus da pesquisa o Estado do Rio Grande do Norte, que vem
sendo beneficiado por políticas de inclusão digital, como o ProInfo – Programa
Nacional de Tecnologia Educacional. Por meio da realização de um grupo focal e da
observação direta com professores da Educação Básica da rede pública de oito
municípios distintos, a fim de analisar através do debate e do diálogo, as informações a
cerca das suas habilidades com as novas TIC’s.
        A pesquisa ocorreu nos municípios de Canguaretama (participaram 10
professores); Ceará-mirim (participaram 08 professores); Lagoa D’anta (participaram 05
professores); Macaíba (participaram 09 professores); Mossoró (participaram 15
professores); São Tomé (participaram 05 professores); São João do Campestre
(participaram 06 professores) e Tangará (participaram 07 professores). Os professores
selecionados estão vinculados ao Programa de Pós-graduação em Ciências da Educação
e Multidisciplinaridade, da Faculdade do Norte do Paraná – FACNORTE, representada
no Rio Grande do Norte pelo Instituto de Ensino Superior Natalense – IESN. Estes
participaram da disciplina: Educação e a Tecnologia da Informação e Comunicação, no
primeiro semestre do ano de 2015. O momento foi propício por reunir profissionais dos
espaços citados, o que proporcionou uma noção geral da realidade periférica
concernente aos docentes da Educação Básica no Estado do Rio Grande do Norte.
        Durante a dinâmica, o diálogo se baseou em questões capazes de captar as ações
e intervenções do professor, suas atitudes de enfrentamento e conhecimento das
estruturas existentes, associadas a uma análise crítica do modo com que esses
profissionais relatam os usos que fazem das tecnologias oferecidas em seu ambiente de
trabalho. O foco dado ao papel social do professor justifica-se por sua importância no
processo ensino-aprendizagem. O professor é o mediador do conhecimento, por isso a
sua atuação pedagógica relacionada aos recursos tecnológicos é de suma importância
para esta pesquisa.
        Em linhas gerais, os professores destacam a importância do uso das TIC’s, mas,
fica claro a discrepância entre o que se propõe e a realidade, ou seja, a uso da tecnologia
esbarra na falta de alguns aparatos tecnológicos específicos, inclusive na própria
insegurança e, até mesmo, na limitação do conceito de tecnologia por parte desses
profissionais. Conforme se poderá avaliar a partir das falas que foram destacadas.
Inicia-se a parte empírica deste artigo com a narrativa de um dos professores
participantes da dinâmica focal:
                        Os valores que dizem respeito ao ambiente e ao próximo, precisam ser
                        enfatizados e trabalhados com lições práticas e reais a partir de exemplos e



                                                                                               109
                       fatos que comprovem sua verdadeira importância. É necessário aproveitar
                       melhor o espaço de sala de aula para a exploração frequente de temas
                       transversais, bem como repensar as ações voltadas para o individual. Não
                       seria um ledo engano da escola e do educador pensar que estaria preparando
                       bem o educando recheando-o de conteúdos e tornando-o “apto” para utilizar
                       as Tic’s? Não há dúvidas de que o conhecimento tecnológico possui sua
                       importância, principalmente quando há uma necessidade cada vez crescente
                       de pessoas acessando o meio informacional. Porém, o homem do futuro
                       estará menos humanizado ao dominar todas as técnicas e ciências e
                       desprezando o seu semelhante ou relacionando-se com este de modo
                       superficial. (FOCAL – CEARÁ-MIRIM)


        É possível verificar preocupações que transcendem o simples uso das
tecnologias, há o comprometimento com os valores solidários, preocupações coletivas e
que devem estar presentes no cotidiano do professor que atua com o mundo virtual e
seus vários caminhos. Entretanto, a limitação reside no conceito que o profissional tem
da própria técnica, ao encará-la de modo positivado, como se essa fosse capaz de, por si
só, desumanizar. Essa é uma dualidade que deve ser evitada e analisada, não há técnica
boa ou ruim, não há na realidade a dicotomia entre ser humano/técnica, como se fossem
polos excludentes. O que deixa perceptível o conflito que esses novos instrumentos
ainda causam, inclusive no espaço escolar, que é o espaço por excelência de construção,
manutenção e perpetuação dos sistemas sociais (Parsons, 1965), no sentido de educar,
manter o sistema social integrado, equilibrado e em movimento de acordo com limites
pré-estabelecidos.
                       A escola possui um poder muito grande em suas mãos: o poder da
                       comunicação – principalmente hoje, através dos diversos tipos de mídias. As
                       tele-salas e laboratórios de informática que promovem a capacidade de trazer
                       o mundo para dentro da escola, através, também, do uso responsável da
                       internet. As informações são aceitas de uma forma gratificante, favorecendo
                       uma aula mais dinâmica e contribuindo como processo de formação de
                       alunos, professores e demais profissionais da educação. (FOCAL – CEARA-
                       MIRIM)


        Como explicitado, o professor reconhece a importância do uso pedagógico das
TIC’s no espaço escolar e destaca como esses instrumentos são capazes de abrir janelas
para novas realidades. Contudo, as propostas nem sempre encontram um ambiente
objetivamente e subjetivamente propício, nem sempre a tecnologia é aceita de forma
gratificante, ao contrário, enfrentam cenários e conhecimentos que podem ser
considerados precários para o seu uso. Como ressalta o profissional a seguir:
                       É um desafio constante trabalhar com as novas tecnologias, porque envolve
                       conhecimento, preparação, pesquisa e persistência. Ocorrendo de acordo com
                       a vontade e preparação do professor em explorá-lo frente às novas
                       tecnologias, com questões relevantes inerentes ao fato de que a educação
                       precisa evoluir sincronizada com a sociedade. [...] Questiona-se o papel da
                       escola e dos professores bem como a necessidade de modificar o papel
                       interventivo dos alunos, pois hoje ensinar não é a mera transmissão de
                       conhecimentos e a tecnologia não é apenas um enfeite na escola, e o
                       professor precisa compreender em quais situações ela efetivamente ajuda no
                       aprendizado dos alunos e qual é o seu papel no processo de aprendizagem dos
                       educandos. Outro ponto a considerar é a formação dos professores para o uso
                       das TICs. Nossa realidade, é que o professor não sabe nem ligar o
                       computador, existe uma urgente necessidade de programas de formação


                                                                                              110
                       continuada, que possibilite a capacitação do professor e demais profissionais
                       envolvidos na Educação, a fim de minimizar a decadência em que se encontra
                       atualmente no ensino, dificultando o desenvolvimento de habilidades dos
                       alunos, que já dominam esses recursos, haja vista viverem em plena era da
                       informação. (FOCAL- MOSSORÓ)


        Este professor sintetiza, em seu depoimento, o desafio de se trabalhar com
distintas tecnologias em espaços periféricos e precários com relação ao acesso as novas
tecnologias informacionais, é o que podemos compreender. Ao formular sua resposta,
identifica seu espaço como crítico e descreve a realidade de professores que não sabem
o mínimo, que é ligar o computador. Situação constatada durante o debate do grupo
focal, já que muitos professores presentes assumiram não saber acessar essas
tecnologias, muitos desabafaram seus anseios e constrangimentos por tal situação. Esse
cenário, como foi exemplificado por alguns professores, os colocam em situação
desprivilegiada e de descrédito diante dos alunos.

                       A evolução destas tecnologias ainda não foi capaz de resolver problemas
                       como a evasão escolar, o déficit de aprendizado, vivemos em contradição
                       com esta revolução, porém alguns aspectos como o acesso a estas tecnologias
                       esta levando os jovens a ter um pensamento mais critico, geração digital,
                       levada por uma onda do consumismo desenfreado, bombardeados por
                       propagandas alienantes... Vários são os avanços, mas não foi possível ou não
                       teve interesse dos governantes de resolver problemas básicos coma citado
                       anteriormente a evasão escolar ou o déficit de aprendizado, todos nós somos
                       educados para ter uma vida funcional. Porém a escolarização não acompanha
                       os níveis de evolução da tecnologia no tocante a estrutura física de uma
                       escola... Física como: carteiras, quadros (lousa), iluminação, conforto
                       térmico, tecnologia empregada no ensino, qualificação dos docentes e
                       “autonomia destes” professores. Como podemos evoluir no campo
                       profissional que é a meta de qualquer escola ou universidade se não temos
                       uma estrutura que nós conforte? Como podemos pensar de forma autônoma
                       se somos autômatos? Ainda vamos aprender as palavras e a criança já sabe o
                       que é download, stop, play, etc. O ensino formal é muito cansativo e as
                       crianças tem dificuldade em saber o básico, porém se perguntamos a ela o
                       número de caracteres que ela pode usar para digitar uma mensagem no
                       celular ela saberá sem duvidas; ou o tempo de um download; ou a capacidade
                       que resta em um cartão de memória; isso ela também será capaz de
                       responder, sabe também a historia de vida de uma celebridade que tem
                       afinação ou a geografia de um campo de obstáculo em uma praça de skate.
                       (FOCAL- MOSSORÓ)


        Ao citar o ensino formal como cansativo, o professor se refere à importância do
profissional se atualizar para acessar às novas tecnologias. Para o profissional o uso das
TIC’s dinamiza o processo ensino-aprendizagem. Entretanto, percebe-se o conflito que
existe em relação ao papel do Estado como fomentador desse processo, das próprias
estruturas físicas em que a efetivação do acesso deveria ocorrer e a atuação docente, o
que afirma o distanciamento entre as propostas e a prática. Essa fala também consolida
uma preocupação constante entre os docentes; a questão para esses educadores está no
cerne da formação, o que inclui as contradições espaciais, a própria insegurança em
relação ao uso dos equipamentos e a consciência que se tem, retrógrada, do que seria o



                                                                                               111
papel do professor. Neste último ponto, destaca-se a existência de um abismo entre o
uso das tecnologias pelo docente.

                       Percebe-se a dificuldade da escola de se reinventar pedagogicamente
                       mediante essas novas tecnologias. Nessa nossa reflexão hoje ficou
                       evidenciado que a falta de qualificação aos professores tem sido o principal
                       fator, e ainda essa expansão tecnológica não chegou nas escolas. Desse
                       modo, as praticas obsoletas continuam presentes no processo ensino e
                       aprendizagem, atrofiando a sociedade. A necessidade de se capacitar os
                       professores é inquestionável. E mais, que essa capacitação precisa ter
                       características especiais, que seja ela oferecida aos professores, a formação
                       em serviço de forma contextualizada, dentro da realidade vivenciada por
                       estes professores como opção viável de formação continuada. (FOCAL -
                       SÃO JOSÉ DO CAMPESTRE)


        O entrevistado expressa a inquietação existente na busca de soluções para o seu
próprio cotidiano escolar, referente à busca de estratégias e capacitações que permitam
o uso criativo e realmente educacional para essas novas tecnologias. O docente reclama
a padronização que não visualiza a realidade de cada espaço, ou seja, sente-se
pressionado por questões que parecem não coadunar com a realidade vivenciada. O uso
das ferramentas tecnológicas na educação parece um empecilho por falta de preparo dos
profissionais da educação, impossibilitando assim que esses recursos possam auxiliar no
processo ensino-aprendizagem de maneira criativa, modificando os padrões atuais.
        Mesmo que os professores sintam dificuldade em introduzir essa ferramenta no
espaço escolar e na sua própria vivência, precisam identificar as habilidades e sintonias
existentes entre eles e os alunos, a fim de mediar o aprendizado de forma coletiva.
Cientes das necessidades e dificuldades em que estão imersos é preciso que sejam
inventivos diante dos seus próprios limites. Como ressalta o docente:

                       Na educação de base das séries iniciais as tecnologias ainda são trabalhadas
                       de modo tímido, apenas auxiliando o ensino e aprendizagem. Faltam mais
                       investimentos em estruturar as instituições de ensino com salas ambiente
                       adequadas, equipamentos tecnológicos que atenda ao número de alunos e
                       professores ou monitores qualificados. (FOCAL – MACAÍBA)



       Na lacuna que existe em relação à formação docente, mais uma vez, reclama-se
da escassez dos investimentos, diante da observação crítica nos grupos focais ficou
claro que existem distintos equipamentos em distintos espaços escolares sem uso
adequado. No mais, ainda foi detectado que a aquisição dos equipamentos tecnológicos
e da conectividade não resolve, por si só, questões históricas e culturais presentes no
ambiente escolar.

5. Considerações Finais
Ao considerar que, além das modificações na vida material, as novas tecnologias
transformaram profundamente as relações sociais e subjetivas dos indivíduos. Não
obstante, temos que afirmar que o acesso e a difusão das novas tecnologias tem
integrado o mundo de modo seletivo e diversificado. E, apesar dos diferentes incentivos



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públicos e mesmo do apelo que as tecnologias têm na sociedade atual não está havendo,
ainda, em muitos espaços, a efetividade no aproveitamento das novas tecnologias da
informação e da comunicação. Caso do espaço analisado.
       A expansão de capacidades, enquanto um instrumento de efetividade tem sido
limitada, visto que é reduzida a integração entre os docentes e as novas tecnologias. O
que compromete a perspectiva de concretização do desenvolvimento como liberdade
(SEN 2000), conforme exposto no transcorrer deste artigo, as propostas que se
coadunam à educação por intermédio das TIC’s constroem a base desse
desenvolvimento. O desenvolvimento como proposto por Sen (2000) só é possível em
uma realidade, na qual, os docentes conquistem suas liberdades, inclusive, uma
formação adequada. Mas, para que isso ocorra, é necessário antes que o ambiente social
propicie as condições fundamentais para que a liberdade se torne o principal meio e o
principal fim do desenvolvimento.
        Contudo, vale ressaltar que o uso das técnicas está atrelado a rede das relações
culturais em todas as dimensões que essa compreende. Equipar todas as escolas com
equipamentos de última geração não é garantia de que os professores estejam
verdadeiramente capacitados, ou, pelo menos, comprometidos. É lícito supor que, para
os docentes vivenciarem um desenvolvimento com expansão das capacidades, devem
antes de tudo, construírem a sua autonomia profissional e ampliar o seu acesso aos
serviços públicos e aos bens comuns, com interesse e participação social. As limitações
ocorrem devido a concepções e a naturalizações que estão arraigadas na cultura escolar
nacional, nesse âmbito os melhores equipamentos não são capazes de transformar o
ensino, nem a realidade escolar. De nada adianta equipar uma escola com as mais
modernas TIC´s, se os professores não estiverem aptos a utilizá-las enquanto
instrumento pedagógico e de liberdade. Se, nem mesmo as tecnologias mais
rudimentares conseguiram ser utilizadas de modo criativo e singular.
        É necessário sublinhar que, para a expansão real das capacidades, há a
necessidade de se quebrar os preceitos e os conceitos que atualmente permeiam a ordem
social. Para tal, deve haver adaptações para com as realidades locais, com a participação
substancial dos envolvidos, com o objetivo de contribuir com a superação das
desigualdades sociais e econômicas. A atuação dos profissionais envolvidos no espaço
escolar é fundamental para a expansão das liberdades, que por sua vez, influenciam na
percepção da tecnologia, não como um elemento neutro, mas, como uma ferramenta
capaz de atuar na produção de consciência crítica.
        O uso das novas TIC’s deve estar adaptado ao ambiente educacional e social,
devendo proporcionar aos envolvidos a habilidade de construir seus próprios pontos de
vista e suas verdades particulares, a partir de tantas verdades parciais. Para que, assim,
possam constituir suas efetivações em prol de um estado de bem-estar e respeito. Nas
palavras de Albuquerque Júnior (2009) a passividade de muitos docentes, a pouca
criatividade e o baixo investimento subjetivo em suas atividades fazem tudo continuar
como está, o que durante muito tempo tem podado as expansões de capacidades. Ou
seja, os professores esperam melhores equipamentos e fomento estatal para aumentarem
a sua capacitação, enquanto estão sendo incapazes e legitimam a fragilidade do seu
campo de atuação. Os alunos são ruins porque a escola e os professores são ruins, um
jogo de empurra que demonstra a necessidade de que pensemos outras formas de
ensinar.


                                                                                      113
       Conclui-se daí, que o sistema educacional deve formar cidadãos que sejam
aprendizes atuantes, criativos, flexíveis, eficazes e autônomos. Cidadãos com estratégias
de ação e aprendizagem adequadas, pessoas capazes de questionar seu contexto social
diante de qualquer aparato tecnológico, utilizando-os de forma efetiva para contribuir
com a transformação social. É exatamente a ideia de protagonismo, de não passividade,
que está imbuída no conceito Senniano de agente. O estímulo por parte do poder
público para desenvolver nas pessoas o espírito participativo, pode ser um aspecto
importante para desenvolver a autonomia, das diversas formas que pode ocorrer. Pode-
se, então, ressaltar o papel central do Estado no incentivo para a emergência de
indivíduos ativos, mas não um papel individual, o que carece da atuação e da força de
vontade do próprio docente em transpor seus limites.

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