=Paper= {{Paper |id=Vol-1862/paper-22 |storemode=property |title=Uma Proposta de Ontologia de Referência para Autorização Orçamentária e Execução da Despesa Pública |pdfUrl=https://ceur-ws.org/Vol-1862/paper-22.pdf |volume=Vol-1862 |authors=Lucas Bassetti R. da Fonseca,Archimedes A. Detoni,João Paulo A. Almeida,Ricardo de Almeida Falbo |dblpUrl=https://dblp.org/rec/conf/ontobras/FonsecaDAF16 }} ==Uma Proposta de Ontologia de Referência para Autorização Orçamentária e Execução da Despesa Pública== https://ceur-ws.org/Vol-1862/paper-22.pdf
        Uma Proposta de Ontologia de Referência para
  Autorização Orçamentária e Execução da Despesa Pública
                   Lucas Bassetti R. da Fonseca1, Archimedes A. Detoni1,2,
                    João Paulo A. Almeida1, Ricardo de Almeida Falbo1
   1
       Departamento de Informática – Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
        Av. Fernando Ferrari, 515, Goiabeiras – 29075-910 – Vitória – ES – Brasil
       2
           Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (IFES)
                                Campus Santa Teresa – ES – Brasil
                    lfonseca@inf.ufes.br, archimedes@ifes.edu.br,
                      jpalmeida@inf.ufes.br, falbo@inf.ufes.br

    Abstract. There are a number of barriers for the consumption of government
    expenditure data by citizens and computational systems. These include the
    lack of standardization in the structure of data in portals, as well as the
    significant complexity of the (highly technical and specialized) subject
    domain. In this paper we address these problems proposing a reference
    ontology for the Brazilian government budget domain.

    Resumo. Dados de execução da despesa orçamentária são os principais
    dados disponibilizados pelos portais de informação governamentais. Apesar
    disso, o consumo e análise destes dados tanto por sistemas computacionais
    quanto pelos cidadãos têm sido dificultados pela falta de padronização na
    estruturação dos dados nos portais, bem como pela barreira da complexidade
    do domínio (técnico e especializado). A fim de mitigar estes problemas, neste
    trabalho é proposto o uso de uma ontologia de referência para o domínio da
    despesa orçamentária brasileira.

1. Introdução
Os orçamentos públicos têm por objetivo controlar a arrecadação e os gastos dos
governos pelo parlamento. Eles têm de incluir previsão de receitas e despesas anuais,
sendo que a despesa pública só pode ser realizada com autorização legislativa
[Giacomoni 2010]. No Brasil, a Lei Orçamentária Anual (LOA) é o instrumento de
gestão e transparência que realiza a previsão e autorização das ações planejadas pelo
governo para um exercício financeiro que, comumente, corresponde ao período de 1o de
janeiro a 31 de dezembro do ano seguinte ao da aprovação da lei [MTO 2016]. Os
mecanismos de controle e gestão do orçamento abrangem tanto a elaboração da lei
orçamentária, quanto a execução das despesas orçamentárias em conformidade com o
planejamento, o que, em princípio, permitiria um controle completo do ciclo de vida das
despesas públicas, desde a sua previsão até o pagamento de credores.
Apesar da ampla disponibilização dos dados sobre despesas (em atendimento à Lei de
Acesso à Informação - Lei n° 12.527/2011 e, mais recentemente, à Política de Dados
Abertos do Poder Executivo Federal - Decreto n° 8.777, de 11/05/2016), a falta de
padronização na estruturação dos dados nos portais governamentais, bem como as




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fontes heterogêneas e não integradas das quais eles advêm, dificultam o consumo e
análise destes dados tanto pelos cidadãos quanto por sistemas computacionais. Como
exemplos, podem ser citados os sistemas computacionais na esfera federal que estão
envolvidos nos processos de programação orçamentária e pagamento das despesas
públicas: (i) o Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (SIOP) - desenvolvido e
mantido no âmbito do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, para apoiar a
elaboração das leis orçamentárias e suas alterações, assim como acompanhar a execução
das ações orçamentárias autorizadas; e (ii) o Sistema Integrado de Administração
Financeira (SIAFI) – desenvolvido e administrado pela Secretaria do Tesouro Nacional,
do Ministério da Fazenda, e utilizado para registro, acompanhamento e controle da
execução orçamentária, financeira e patrimonial do governo federal.
Soluções tecnológicas baseadas em ontologias podem ser adotadas para mitigar este tipo
de problema. O próprio governo federal tem investido na construção de ontologias a fim
de possibilitar o intercâmbio de informações no nível semântico, buscando viabilizar a
interoperabilidade entre diversas fontes de dados (portal do e-VoG - Vocabulários e
Ontologias do Governo Eletrônico - disponível em http://vocab.e.gov.br/). Outros
exemplos de iniciativas de construção de modelos ontológicos para o domínio do
orçamento público federal são apresentadas por Araújo et al. (2012), CoLab (2012) e
Martins et al. (2013). Esses modelos têm como finalidade retratar os conceitos e a
classificação dos itens que compõem o orçamento federal utilizados no SIOP, com foco
explícito no desenvolvimento de ontologias operacionais descritas em OWL, sem
aprofundamento quanto à natureza semântica dos conceitos modelados e suas relações.
Talvez por esses motivos, CoLab (2012) e Martins et al. (2013) nem sequer mencionem
as informações pertinentes à execução das despesas públicas federais, tais como
empenho, liquidação e pagamento. E mesmo Araújo et al. (2012), ao modelar esses
conceitos em sua ontologia, tratam-nos apenas de forma consolidada. Por exemplo, para
um item orçamentário autorizado, o modelo prevê apenas a possibilidade de se
conhecer, a partir do valor orçamentário autorizado para gasto com este item, o
quantitativo orçamentário comprometido na execução (valor empenhado), ou o
quantitativo financeiro pago, não sendo representado, por exemplo, o ente (pessoa ou
empresa) que recebeu o recurso público. Portanto, aqueles modelos não se ocupam em
retratar conceitos envolvidos na efetiva execução da despesa pública.
A proposta de ontologia apresentada neste trabalho se diferencia por ampliar o escopo
modelado, abrangendo tanto os conceitos inerentes ao processo de autorização e
gerenciamento orçamentários (no caso da esfera federal, o escopo do SIOP), quanto
aqueles relacionados ao processo de execução da despesa pública (no caso da esfera
federal, o escopo do SIAFI). Dessa forma, a conceituação da despesa orçamentária é
modelada usando-se uma granularidade mais fina (p. ex., revelando o credor de recursos
públicos empenhados e/ou pagos, revelando pagamentos individuais ao invés de valores
agregados). Além disso, por se tratar de uma proposta de ontologia de referência, busca-
se identificar com maior clareza e precisão a natureza semântica das entidades e suas
inter-relações no domínio tratado. Pretende-se, portanto, melhorar a compreensão dos
dados publicados pelo governo, assim como viabilizar seu uso e integração no nível
semântico, beneficiando o cidadão e seu processamento por sistemas computacionais.




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2. Ontologia de Referência
Para representar a ontologia de referência sobre Autorização Orçamentária e Execução
de Despesa Pública, foi utilizado o perfil OntoUML, que introduz estereótipos no
diagrama de classes com base em meta-propriedades ontológicas, as quais permitem a
criação de ontologias alinhadas com uma ontologia de fundamentação [Guizzardi 2005].
Uma importante característica de OntoUML explorada nesta ontologia é a reificação de
associações usando-se o conceito de relator [Guarino and Guizzardi 2015]. Um relator
captura a forma como entidades se relacionam em certo contexto, desempenhando
papéis (roles). Relators são particularmente importantes para a representação de
relações sociais (p.ex. o casamento civil entre duas pessoas), e têm sido explorados em
trabalhos recentes como elemento chave para a representação de compromissos sociais
entre agentes [Guizzardi et al. 2008], relações legais (UFO-L) [Griffo et al. 2015] e
relações de serviço (UFO-S) [Nardi et al. 2015].
O escopo da ontologia inclui as etapas de: (i) autorização e gerenciamento
orçamentários (a partir da elaboração da LOA); e (ii) execução da despesa pública
(subdividida nas fases de empenho, liquidação e pagamento). Dessa forma, é possível
rastrear despesas executadas em conformidade com a lei orçamentária que autoriza
essas despesas, estabelecendo neste processo os papéis das entidades envolvidas e as
relações entre elas. Cada uma dessas etapas é detalhada a seguir, apresentando os
fragmentos correspondentes da ontologia. A Figura 1 apresenta o fragmento da
ontologia que trata da LOA e seus itens na etapa de autorização orçamentária.




              Figura 1. Fragmento da Ontologia: Autorização Orçamentária

A Lei Orçamentária Anual é composta de itens (Item da LOA). Cada item refere-se a
uma relação de autorização de um Ente Federativo para uma Unidade Orçamentária,
papel desempenhado neste contexto por uma Unidade Organizacional da
administração pública. Esta relação de autorização é considerada um relator social.
Considerando a taxonomia de relações legais apresentadas na ontologia núcleo UFO-L,
este relator é do tipo no-right-permission to act [Griffo et al. 2015], o que significa que
há uma permissão para agir sem estar obrigado a tal. O objeto desta permissão é a
despesa pública, ou seja, a partir da criação da LOA, existe a autorização para executar
despesas cujas características são capturadas no conteúdo de cada Item da LOA.




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Para representar a classificação por natureza de despesa, foram incluídas categorias de
categorias de despesas modeladas através dos powertypes Modalidade de Aplicação,
Categoria Econômica e Grupo da Despesa. Instâncias dessas categorias são também
classes que tipificam as despesas, como por exemplo “Despesa Corrente” (instância de
Categoria Econômica) e “Pessoal e Encargos Sociais” (instância de Grupo da
Despesa). A autorização, portanto, é para a realização de despesas de tipos específicos,
tipos estes capturados no conteúdo do Item da LOA. Por exemplo, um Item da LOA
autorizando gastos com salários de servidores faria menção aos tipos “Despesa
Corrente” e “Pessoal e Encargos Sociais”. Assim a ontologia captura não somente tipos
de primeira ordem, mas também tipos de segunda ordem de acordo com a teoria multi-
nível (MLT) apresentada por Carvalho e Almeida (2015). Foi utilizada a relação de
subordinação (isSubordinateTo) para representar que instâncias de Grupo de Despesa
necessariamente especializam instâncias de Categoria Econômica (p. ex. “Encargos
Sociais” é necessariamente uma especialização de “Despesa Corrente”).
A Figura 2 apresenta o fragmento da ontologia que trata sobre os empenhos e
pagamentos no processo de execução da despesa pública.




         Figura 2. Fragmento da Ontologia: Execução da Despesa Pública
A Unidade Gestora (UG) é uma especialização da Unidade Orçamentária (UO –
termo utilizado pelo SIOP na esfera federal) com capacidade administrativa. Na esfera
federal, as UGs possuem cadastro exclusivamente no SIAFI, sendo um conceito distinto
das UOs, possuindo inclusive códigos identificadores diferentes. A Unidade Gestora é
investida do poder de gerir dotações orçamentárias e financeiras próprias ou
descentralizadas [Giacomoni 2010].
A primeira etapa da execução orçamentária é o Empenho, que representa a relação de
obrigação da Unidade Gestora para com o Credor (favorecido). O Empenho garante
que existe disponibilidade orçamentária para pagar o compromisso assumido,




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tipicamente condicionado à entrega de um bem material, ou de serviço, do Credor para
a Unidade Gestora. Essa relação é discriminada por meio dos Itens de Despesa
(relators) que compõem o Empenho. Estes itens, por sua vez, são classificados por
Modalidade de Aplicação, Categoria Econômica, Grupo da Despesa, Elemento de
Despesa e Subelemento de Despesa. Um Item de Despesa está em conformidade com
um Item da LOA quando a Modalidade de Aplicação, a Categoria Econômica e o
Grupo da Despesa do Item de Despesa são aqueles prescritos no Item da LOA.
Elemento de Despesa e Subelemento de Despesa são classificadores mais específicos
da despesa e não são determinados previamente no Item da LOA.
O Pagamento representa a última etapa da execução da despesa pública, que consiste
em uma nova relação na qual a Unidade Gestora quita sua obrigação para com o
Credor, registrando o repasse do numerário correspondente ao Credor. O Pagamento
só é efetuado mediante prévia liquidação, que consiste na confirmação de entrega do
material ou serviço realizado pelo Credor.

3. Conclusão
A Lei de Acesso a Informação tem sido um fator importante para a transparência na
fiscalização dos gastos públicos e combate à corrupção, através da disponibilização em
portais Web de dados governamentais para os cidadãos. Contudo, há uma série de
empecilhos para o consumo e ligação dos dados disponibilizados pelos portais.
Geralmente, esses dados advêm de fontes heterogêneas, padecendo da falta de uma
estrutura padronizada. Diferentes portais e sistemas relatam informações parciais sobre
o mesmo processo de forma desarticulada. Além disso, os dados do orçamento são
descritos em duas fontes de naturezas distintas: (i) a legislação, que utiliza terminologia
e jargão mais abstratos e sem detalhamento, e (ii) os manuais técnicos de sistemas, que
se restringem à descrição de aspectos operacionais do preenchimento de “telas” e/ou
“formulários” e à execução de transações de sistema. Isto faz com que haja
terminologias e conceituações diferentes, o que é exacerbado pelo fato de que o
orçamento abrange diferentes esferas de poder, coordenação entre diferentes órgãos de
um mesmo poder e diferentes etapas de um processo eminentemente técnico.
Neste artigo foram relatados os primeiros passos no desenvolvimento de uma ontologia
de referência para a autorização orçamentária e execução da despesa pública. O uso de
uma linguagem bem fundamentada (OntoUML) permite ancorar os conceitos na
ontologia de fundamentação subjacente (UFO). Neste processo, o conceito de relator
teve um papel central para estabelecer a semântica das entidades envolvidas, uma vez
que a programação orçamentária e a execução da despesa podem ser compreendidas
como relações sociais que se desdobram em uma cadeia de dependências ao longo do
processo, envolvendo diferentes atores que desempenham diferentes papéis.
Diferentemente das ontologias existentes sobre o orçamento público, a ontologia aqui
descrita abrange tanto a programação orçamentária, quanto a execução da despesa.
Um estudo de caso com dados reais do Portal da Transparência do Governo Federal foi
realizado como prova de conceito. A ontologia foi transformada em um artefato
computacional (OWL), por meio da transformação automática descrita em [Barcelos et
al. 2013] e implementada no ferramental que dá suporte a OntoUML [Guerson et al.
2015]. Com base na ontologia, uma amostra de dados foi retirada do Portal da
Transparência e transformada para o formato RDF, sendo disponibilizada para consultas




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por meio de um SPARQL endpoint. Questões de competência foram implementadas em
consultas SPARQL dando origem a casos de teste para validação. A ontologia em OWL
assim como as consultas e o SPARQL endpoint estão disponíveis em
https://github.com/LucasBassetti/despesa-orcamentaria.
Como trabalho em andamento, está-se desenvolvendo a axiomatização da ontologia
para melhorar sua precisão. Neste processo, estão sendo utilizadas as funcionalidades de
simulação e validação de modelos OntoUML através de um mapeamento automático
[Guerson et al. 2015] para a linguagem formal Alloy [Jackson 2006].

Referências
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  Orçamento Federal. Proceedings of Ontobras, p. 266–271.
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  Structures: A Multi-level Approach. IEEE 19th Int. EDOC Conference, p. 50–59.
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  Ontologia para as Despesas e Receitas do Orçamento Público Federal Brasileiro.
  http://colab.each.usp.br/?page_id=296. Accessed: 2016-06-02.
Giacomoni, J. (2010). Orçamento Público. Atlas.
Griffo, C. et al. (2015). Towards a Legal Core Ontology based on Alexy’s Theory of
  Fundamental Rights. Multilingual Workshop on Artificial Intelligence and Law,
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Guerson, J., Sales, T. P., Guizzardi, G., and Almeida, J.P.A. (2015). OntoUML
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Guizzardi, G. (2005). Ontological foundations for structural conceptual models. CTIT,
 Centre for Telematics and Information Technology.
Jackson, D. (2006). Software Abstractions: Logic, Language and Analysis. MIT Press.
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Nardi, J.C. et al. 2015. A commitment-based reference ontology for services.
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