Docência e Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação: Matrizes Curriculares das Licenciaturas Gabriela Teles1, Deyse Mara Romualdo Soares1, Thayana Brunna Queiroz Lima Sena1, Luciana de Lima1, Robson Carlos Loureiro 1 Universidade Federal do Ceará (UFC) – Grupo de Pesquisa Tecnodocência Av. Humberto Monte, s/n – 60.440-554 – Fortaleza – CE – Brasil {gabiteles2s.as, deysemarasoares, thayanabrunna}@gmail.com, {luciana, robson}@virtual.ufc.br Abstract. The objective of this work is to describe how the integration between Teaching and Digital Technologies of Information and Communication (DTICs) has been approached in the curricular matrices of the Public Institutions of Higher Education (PIHE). A Case Study was developed, in which the curricular matrices of fourteen (14) undergraduate courses were analyzed, observing the disciplines that relate Teaching and DTICs. It was proceeded with the data triangulation, based on the number of subjects per course; in the type of discipline; and in the semesters in which they are offered. The existence of a reduced number of disciplines was verified, being the majority optional and carried out in the last semesters of the courses. Resumo. O objetivo deste trabalho consiste em descrever como a integração entre Docência e Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDICs) tem sido abordada nas matrizes curriculares das Licenciaturas em Instituição Pública de Ensino Superior (IPES). Foi desenvolvido Estudo de Caso, em que as matrizes curriculares de quatorze (14) cursos de Licenciatura foram analisadas, observando-se as disciplinas que relacionam Docência e TDICs. Procedeu-se com a triangulação de dados, com base na quantidade de disciplinas por curso; no tipo de disciplina; e nos semestres em que são ofertadas. Verificou-se a existência de um número reduzido de disciplinas, sendo a sua maioria optativa e cursada nos últimos semestres dos cursos. 1. Introdução A Docência, em meados do século XVI, foi entendida e desenvolvida como atividade de cunho religioso, pautada na vocação e nas virtudes do mestre. Diante do contexto de Revolução Industrial, verificou-se a demanda por uma formação dos indivíduos para o trabalho e para a cidadania, aspecto que solicitou a profissionalização do ensino. Observa-se, assim, que a história da Docência está diretamente relacionada aos anseios da governamentalidade, em uma dinâmica em que o Estado e o Mercado a dominam e direcionam há séculos, de modo que ela tem servido como meio para adequação dos indivíduos à determinada realidade. Alves e Batista (2016) salientam que a Docência tem como foco a formação dos cidadãos para a convivência social e para o desempenho de funções trabalhistas. 57 Atrelada diretamente a tal aspecto, a formação docente, historicamente tem sido direcionada por e para tais anseios, aspecto que, segundo [Passos e Rocha 2015, p.44], influencia diretamente nas “[...] concepções de currículos, formatos acadêmicos e opções metodológicas”, percebendo-se a necessidade de um repensar quanto ao modelo imposto. Conforme Lima e Loureiro (2015), os docentes são (en)formados, seguindo um modelo fechado, pretensamente acabado e determinado em suas verdades. Assim, a tendência é que em suas práticas no contexto escolar, esses profissionais prossigam perpetuando o modelo a que tiveram acesso durante a sua vida escolar e acadêmica, em um ciclo vicioso. Prata (2008) ressalta a dificuldade experimentada pelo professor em construir-se como um profissional que conhece e pratica os diferentes modelos didático- metodológicos de Docência, considerando-se que esse profissional foi formado unicamente com base no modelo tradicional. Contrariamente a esse cenário, observa-se o advento e o avanço de mudanças significativas no contexto contemporâneo, processo acompanhado pela intensificação de diferentes problemáticas no âmbito escolar: evasão, violência na e da escola, professores que não ensinam e alunos que não aprendem, dentre outras. O aluno de hoje não é o mesmo aluno de séculos anteriores e, “bombardeado” cotidianamente por diversas informações, consegue expressar cada vez maior dificuldade em perceber a validade da escola e dos conhecimentos que nela são abordados. Tal aluno entende que para ter acesso a informações (geralmente confundidas com conhecimentos) não se faz necessário dispender, no mínimo, quatro horas do seu dia, sentado em uma cadeira, ouvindo as verdades absolutas repassadas pelo professor [Sibilia 2012]. Diante do avanço tecnológico, esse aluno é outro, aspecto que exige do professor novas competências que precisam ser contempladas em seu processo de formação inicial e continuada [Garcia et al. 2011]. O indivíduo dessa sociedade contemporânea organiza, produz, compartilha, divulga as suas impressões e considerações de maneira diferenciada, aspecto que precisa ser observado pelo professor [Kenski 2008]. Nesse cenário, utilizar as TDICs na Docência aparece como uma possibilidade dinamizadora do processo de ensino e aprendizagem, conforme enfatizado por Almeida (2008), sendo relevante que o docente as utilize de maneira crítica e criativa. Entende-se que os docentes devem utilizar as TDICs no sentido de mobilizar os discentes a perceberem e praticarem outras docências, (re)construindo o ser professor e o ser aluno, para além da concepção de transmissor e de receptor de conhecimentos preestabelecidos. Salienta-se a relevância de que a utilização das tecnologias digitais esteja para além da ideia de que as tecnologias servem como “ferramentas de auxílio pedagógico” [Alves e Batista 2016, p. 55]. Faz-se necessário, nesse sentido, integrar Docência e TDICs, de maneira que ambas as áreas do saber se transformam, se refazem para atender as exigências uma da outra. Nessa perspectiva, a Docência solicita das TDICs o que precisa para planejar, executar e avaliar outras práticas didático-metodológicas condizentes com o contexto e com as demandas tanto de professores quanto de alunos; ao passo em que as TDICs 58 compreendem tais demandas, planejando, executando e avaliando ferramentas, recursos conectados a tal realidade. Dessa forma, compreende-se a relevância de que os licenciandos tenham acesso, em seus processos de formação, a disciplinas que os inquietem, na teoria e na prática, a perceberem outras possibilidades conectadas ao contexto de integração entre Docência e TDICs. Sobre isso, Souza Júnior et al. (2007) enfatiza a necessidade de que os professores sejam formados adquirindo competências que os possibilitem o desenvolvimento de materiais ou a adaptação dos que estão disponíveis, com base em sua opção didático-metodológica. Diante disso, considera-se pertinente indagar: Como a integração entre Docência e TDICs tem sido abordada nas matrizes curriculares das Licenciaturas em Instituição Pública de Ensino Superior (IPES)? A partir de tal questionamento, tem-se que o objetivo desse trabalho consiste em descrever como a integração entre Docência e TDICs tem sido abordada nas matrizes curriculares das Licenciaturas em Instituição Pública de Ensino Superior (IPES). 2. Integração entre Docência e TDICs na Formação Docente Almeida (2000) destaca que, diante das transformações vivenciadas na sociedade contemporânea, ressaltando-se o cenário de intenso avanço tecnológico, é estabelecido um novo universo permeando a vida das pessoas. Este novo universo, na concepção da autora, traz consigo novas exigências aos indivíduos que precisam ser autônomos, criativos e críticos, tendo habilidade para obter e selecionar informações e para construir conhecimentos. Atrelando tal cenário ao contexto da Docência, verifica-se que o modelo expositivo, no qual o professor se ocupa em transmitir o conhecimento, devendo o aluno absorvê-lo, não condiz com a realidade apresentada e com as novas demandas oriundas desse novo universo. Papert (2008) ressalta que, historicamente, a escola se ocupou em seguir apenas um modelo, sendo evidente a dificuldade em romper com a sua uniformidade. Dessa forma, o repensar da Docência, compreendendo-a como construção social, conforme enfatizado por Veiga (2006), e como trabalho interativo, reflexivo e flexível, segundo Tardif e Lessard (2011), faz-se necessário. Nessas concepções, a Docência aparece como um trabalho que se encontra em constante processo de construção/reconstrução e que é desenvolvido na relação de um ser humano com o outro, e não de um ser humano para/sobre o outro. O aluno, nesse processo, não pode ser considerado como o indivíduo que apenas recebe o que lhe é fornecido, mas como aquele que “[...] pensa sobre as questões e situações com as quais se depara, reorganizando sua estrutura cognitiva”, em um processo de construção [Sampaio e Leite 2013, p. 54]. Observa-se, assim, a demanda pelo repensar e pela transformação da formação docente, reconhecendo-se que os docentes atuam, geralmente, em consonância com o modo como foram (en)formados, conforme salienta [Prata 2008]. Lima (2008) enfatiza que a formação inicial dos professores tem ocorrido com base em aspectos eminentemente teóricos e desconectados da aprendizagem. Nesse sentido, Lima e Loureiro (2016) ressaltam que a formação docente tem ocorrido de maneira fragmentada, sendo marcada pela desconexão e pelo desequilíbrio 59 entre as disciplinas teóricas e práticas e pela descontextualização, de modo que a realidade e os conhecimentos dos alunos não têm sido considerados, inclusive no que se refere às TDICs. Diante disso, evidencia-se que tais indivíduos precisam ser mobilizados, na teoria e na prática, a (re)conhecerem outras possibilidades de Docência, rompendo com a uniformidade pretendida pela governamentalidade. Verifica-se a necessidade de que os licenciandos contem com disciplinas que integrem Docência e TDICs. Sampaio e Leite (2013) ressaltam que, no contexto contemporâneo, é necessário que o processo de formação docente seja marcado pelo conhecimento, interpretação, utilização, reflexão e dominação crítica da tecnologia, de modo que os indivíduos não sejam dominados por ela ou a utilizem unicamente, conforme Moran (1995), para atender a mais uma imposição externa. Almeida (2008) reconhece o fato de que as TDICs ampliam os espaços de interação, potencializam as trocas afetivas, incentivam a produção compartilhada e colaborativa de conhecimentos, de modo que utilizá-las no contexto da Docência aparece como um elemento interessante e um possível gerador de desequilíbrios favorecedores do advento de mudanças nas práticas didático-metodológicas. Entretanto, salienta-se que somente o uso da tecnologia não garante a produção das transformações observadas como necessárias. Para Valente (2001), o uso das TDICs pelo professor, somente para auxiliá-lo na transmissão do conhecimento, não transforma o cenário vigente de desalinhamento entre os discursos docentes e discentes, conforme enfatizado por Lima e Loureiro (2015). Sampaio e Leite (2013), ao abordarem o contexto do surgimento da área de Tecnologia Educacional (TE), inicialmente ligada à visão tecnicista, enfatizam a concepção de que com a inserção das TDICs no âmbito educacional, apostou-se no fato de que somente fazer uso de determinadas ferramentas e recursos tecnológicos garantiria o controle, pelo professor, do processo de ensino e aprendizagem. Em tal perspectiva, tem-se que os instrumentos de trabalho docente são mais significativos do que a prática pedagógica. Ressalta-se que a relação entre Docência e TDICs tem início a partir da comercialização dos primeiros computadores, em meados da década de 1950. O computador, nesse contexto, era compreendido como uma máquina que armazenava informações a serem transmitidas aos alunos, visando instruí-los [Valente 1995]. Valente (2001) questiona essa perspectiva, denominada de instrucionista, salientando a necessidade de que as TDICs sejam utilizadas na Docência, no sentido da construção do conhecimento, de maneira que os alunos sejam mobilizados a desenvolverem produtos de seus interesses, seguindo a perspectiva construcionista. Assim, entende-se que tais áreas do saber não devem ser concebidas de maneira isolada, mas em uma relação integradora. A Teoria da Espiral da Aprendizagem, pautada no construcionismo, é composta por quatro estágios: descrição, no qual o aluno descreve o que a máquina precisa executar; execução, em que a máquina executa o que foi descrito; reflexão, em que o aluno analisa o que a máquina executou, fazendo a comparação com o que foi descrito; e depuração, momento em que o aluno reinicia o processo, caso perceba que o resultado obtido não foi o esperado [Valente 1995]. 60 Para Papert (2008), as TDICs precisam ser utilizadas como instrumentos que auxiliam o trabalho e o pensamento, que favorecem a realização de projetos e o planejamento, desenvolvimento e avaliação de novos conceitos, de novas ideias. Nessa concepção, as TDICs ultrapassam a ferramenta e se efetivam como sistematização do pensamento, com base na qual o indivíduo cria, produz, inova. Nessa perspectiva, os alunos utilizam as TDICs de maneira vinculada aos seus propósitos, exercendo a criatividade. Com isso, [Papert 2008, p.167] ressalta que as TDICs (no caso do seu estudo em particular, os computadores) aparecem como apoio a “[...] formas diferentes de pensar e aprender”. Assim, é evidenciada a necessidade de que Docência e TDICs sejam integradas, de modo que, nessa relação, tanto as práticas didático-metodológicas quanto as ferramentas e os recursos tecnológicos se modifiquem. Demo (1991) alerta que o processo educacional deve ocupar-se com a formação ideológica direcionada para a emancipação, mas também com uma formação tecnológica que estimule o desenvolvimento da inteligência criativa. Dessa forma, compreende-se a relevância da existência de disciplinas no contexto das Licenciaturas que abordem, na teoria e na prática, as diferentes possibilidades que permeiam a relação entre Docência e TDICs, compreendendo-se o significado dessa relação para a formação docente e para o fazer profissional do professor. Conhecer e refletir sobre as Matrizes Curriculares dos Cursos de Licenciatura parece ser um elemento significativo para conhecer e refletir sobre o próprio processo de formação docente, considerando-se que o currículo, conforme Gatti (2016), é uma base de orientação e de sustentação desse processo. 3. Metodologia A presente pesquisa tem como base metodológica o Estudo de Caso. Conforme Yin (2005), esta abordagem configura-se como uma investigação empírica e é indicada quando são examinados eventos contemporâneos, em que os comportamentos não são passíveis de manipulação. Além disso, as questões orientadoras do Estudo de Caso são do tipo como ou por que. Yin (2005) ressalta que nessa abordagem os limites entre o fenômeno e o contexto não são evidentes. O Estudo de Caso é marcado pela grande quantidade de variáveis, pela demanda, pela triangulação dos dados obtidos e pela requisição da utilização de proposições teóricas. Os dados utilizados na pesquisa referem-se ao contexto de quatorze (14) Licenciaturas existentes na IPES investigada, de modo que as suas Matrizes Curriculares foram acessadas e analisadas. Os cursos de Licenciatura investigados foram: Ciências Biológicas; Dança; Educação Física; Filosofia; Física; Geografia; Matemática; Música; Pedagogia; Química; Teatro; História; Letras; e Ciências Sociais. A pesquisa foi desenvolvida em três etapas: planejamento, coleta e análise de dados. Na primeira etapa, foram produzidos os protocolos de coleta de dados e a política de armazenamento. A função do protocolo no Estudo de Caso consiste em “[…] orientar o pesquisador ao realizar a coleta de dados” [YIN 2005, p.92]. A coleta de dados ocorreu a partir da busca, download e leitura das Matrizes Curriculares dos cursos de Licenciatura. Na análise, foi observado, nos títulos de todas 61 as disciplinas (obrigatórias e optativas) constantes nas Matrizes, a existência de relação entre Docência e TDICs, no sentido de verificar como os cursos de Licenciatura propõem a inserção das tecnologias digitais para que os estudantes das IPES compreendam-na no contexto da docência como prática e teoria. Nesse sentido, a Pesquisa Documental também compõe o arcabouço metodológico desse estudo, de maneira que as fontes que a formaram advêm de documentos (as Matrizes Curriculares) que não receberam um tratamento analítico [GIL 2010]. Com isso, os títulos das disciplinas localizadas foram organizados em planilha eletrônica, sendo verificados os seguintes aspectos: quantidade de disciplinas ofertadas por curso; tipo de disciplina (obrigatória ou optativa); e semestre em que estas são ofertadas. Os dados obtidos foram calculados em proporções. 4. Resultados e Discussão A partir do desenvolvimento da pesquisa, foram obtidos dados que revelam um contexto passível de reflexões e questionamentos no que se refere ao processo de formação docente, considerando-se as demandas advindas da sociedade do conhecimento. Nessa sociedade, conforme Lévy (1996), tem-se um cenário posterior ao da tecnologia da oralidade e da escrita. No que se refere ao primeiro aspecto observado, concernente à quantidade de disciplinas que relacionam Docência e TDICs, verificou-se que 35,7% dos cursos (Ciências Biológicas, Música, Química, Teatro e Ciências Sociais) contam somente com três (3) disciplinas que evidenciam em seus títulos a supracitada relação. Do universo dos quatorze (14) cursos de Licenciatura observados, 28,6% contam com duas disciplinas que abordam a questão em análise, sendo eles: Dança, Educação Física, Filosofia e História. O mesmo percentual (28,6%) representa os cursos que contam com cinco (5) e sete (7) disciplinas. Ressalta-se que as Licenciaturas com cinco (5) disciplinas são Física e Geografia; enquanto as que possuem sete (7) referem-se à Pedagogia e Letras. O curso de Matemática conta com quatro (4) disciplinas que relacionam as duas áreas do saber observadas, representando 7,1% do total. Tabela 1. Quantidade de disciplinas que relacionam Docência e TDICs Curso de Licenciatura Quantidade de disciplinas Pedagogia 7 Letras 7 Física 5 Geografia 5 Matemática 4 Biologia 3 Música 3 Química 3 Teatro 3 62 Ciências Sociais 3 Dança 2 Educação Física 2 Filosofia 2 História 2 Total 51 Diante de tais dados, considera-se, tendo como base Silva e Fernandes (2007), que a Universidade, com ênfase nos cursos de Licenciatura, tem caminhado de maneira desconectada dos alunos que a compõem, ressaltando-se o fato de que esses indivíduos estão imersos no universo tecnológico. Para além disso, ao compreender que tais discentes atuarão como professores de outros indivíduos que também fazem parte desse cenário de imersão tecnológica, observa-se a contradição que tem marcado o processo de formação docente. Revela-se, de certo modo, pela quantidade de disciplinas encontradas nos cursos que relacionam Docência e TDICs, que a formação docente ainda não tem considerado os saberes tecnológicos. Contrariamente ao contexto observado, Barbosa (2008) ressalta a necessidade de que a Docência se ocupe em refletir sobre as mudanças que permeiam a sociedade, compreendendo-se que ela não deve estar alheia ao cenário que a envolve. Atrelado a tal aspecto, Pereira e Lopes (2005) enfatizam que a utilização das TDICs na Docência mobiliza a formação de sujeitos reflexivos, criativos e integrados ao novo que forma a sociedade, aparecendo como um elemento necessário não apenas por interesses governamentais, mas como demandas advindas de docentes e discentes. Com relação ao tipo de disciplina encontrada na pesquisa, observou-se que do total de cinquenta e uma (51) disciplinas localizadas, que relacionam Docência e TDICs, quarenta e quatro (44) delas (86,3%) são optativas e sete (7) são obrigatórias. O percentual de disciplinas obrigatórias corresponde a 13,7% do total. Salienta-se que as disciplinas optativas são as que estão disponíveis na Matriz Curricular do curso, mas que os licenciandos têm a opção de cursá-las ou não. Cada curso conta com uma carga horária de disciplinas optativas que são disponibilizadas, mas a escolha será feita a critério do licenciando, não havendo, desse modo, o elemento da obrigatoriedade. Com isso, verifica-se que a maioria das disciplinas ofertadas nas Licenciaturas que conecta Docência e TDICs são optativas, havendo a possibilidade de que o licenciando conclua o seu processo inicial de formação docente sem participar de nenhuma disciplina que aborde essa relação. Entende-se que tais áreas precisam ser percebidas e contextualizadas de maneira conectada, pois a questão não está centrada somente no uso das TDICs, mas em uma utilização pautada no “repensar dos processos educacionais”, de modo que essas duas áreas do saber se transformem para responder as demandas uma da outra [Valente 1995 p.41]. Kenski (2008) enfatiza a necessidade de que o docente repense e transforme o seu fazer cotidiano, considerando a sociedade do conhecimento. Nesse sentido, a autora 63 destaca que diante do universo de informações facilmente acessadas, não existem condições para que o professor continue tentando transmitir o que sabe. O contexto e o aluno de hoje, considerado como digital native, conforme Lima e Loureiro (2016), não requerem mais a utilização dessa única base didático-metodológica. Dessa forma, a demanda por uma formação docente que mobilize os licenciandos a visualizarem e vivenciarem a conexão entre essas duas áreas do saber faz-se necessária. Sobre isso, [Silva e Fernandes 2007, p.62] salientam a necessidade de que no processo de formação docente, os licenciandos aprendam não somente a utilizar os recursos tecnológicos produzidos por terceiros, mas também a produzirem os seus próprios materiais, sabendo utilizar as TDICs em uma “[…] perspectiva de mediação pedagógica”. Quanto ao último aspecto observado, relativo ao semestre em que as disciplinas são disponibilizadas, obteve-se que 70,6% delas são ofertadas no oitavo semestre, momento em que a maioria dos cursos estão sendo concluídos. 9,8% são ofertadas no sétimo semestre, seguido por 7,8% que são disponibilizadas no nono e 5,9% que podem ser cursadas no décimo semestre. Com relação ao quarto, quinto e sexto semestres, observou-se que em cada um deles consta somente uma disciplina que relaciona Docência e TDICs, perfazendo um total de 5,9%. Nos primeiros semestres (primeiro, segundo e terceiro) não foi localizada nenhuma disciplina sobre Docência e TDICs disponível. Dessa forma, questiona-se como, diante do cenário observado, o docente conseguirá integrar Docência e TDICs, em seu contexto profissional, se durante a sua formação ele contou com poucas disciplinas que abordavam tal questão, sendo a sua maioria optativa e ofertada no final dos cursos. Lima Junior (2005) destaca a necessidade de que o docente remodele a sua prática, diante do cenário contemporâneo, enfatizando a relevância do processo de formação inicial para tal. Ponte (2000) enfatiza a complexidade existente para que sejam encontradas formas produtivas e viáveis de integrar Docência e TDICs, apontando para a necessidade de que os currículos e as práticas didático-metodológicas desenvolvidas nos cursos de Licenciatura sejam repensadas e reconfiguradas. A esse respeito, Kenski (2013) sinaliza que os licenciandos precisam ser desequilibrados, no sentido de terem acesso a um arcabouço de conhecimentos teóricos e práticos que os mobilize a atuar para além dos espaços e das amarras tradicionais, aspectos exigidos pela nova cultura e pela própria dinâmica de professores e alunos no contexto atual. 5. Considerações Finais Com o desenvolvimento da pesquisa que apresentou como objetivo descrever como a integração entre a Docência e as TDICs tem sido abordada nas Matrizes Curriculares das Licenciaturas em IPES, foi possível verificar um cenário de desconexão entre essas duas áreas do saber no processo de formação docente. Sobre o primeiro aspecto observado, relativo à quantidade de disciplinas que, em seus títulos, revelam uma conexão entre Docência e TDICs, percebeu-se que a maioria dos cursos verificados conta com duas ou três disciplinas. Tal aspecto revela, com base em Kenski (2008), que as demandas do contexto contemporâneo, tanto de docentes 64 quanto de discentes, têm sido pouco consideradas, sendo negado o caráter de indissociabilidade existente entre essas duas áreas do saber. Quanto ao segundo aspecto analisado, constatou-se que a maioria das disciplinas que estabelecem uma relação entre Docência e TDICs são optativas, expressando novamente que esse debate não tem sido priorizado no processo de formação dos licenciandos. Apesar de serem digital natives que logo estarão atuando como professores de outros indivíduos em semelhante circunstância, os saberes tecnológicos, conforme enfatizado por Lima (2008), não têm sido abordados de maneira integrada aos saberes pedagógicos, aspecto passível de reflexões e mudanças, considerando que um componente relevante para o fazer Docente é a execução de um trabalho contextualizado e conectado à realidade dos alunos. O terceiro aspecto verificado, concernente ao semestre em que as disciplinas são ofertadas, caminha em consonância com os outros aspectos, ao passo em que se observou que tais disciplinas são ofertadas, em sua maioria, nos últimos semestres da formação dos licenciandos. Constata-se, assim, a prevalência da dissociação histórica entre Docência e TDICs no processo de formação docente, embora seja reconhecido por teóricos como Papert (2008), Valente (2001), Kenski (2008), Almeida (2008) que integrar tais áreas pode se constituir como um caminho mobilizador de mudanças. Referências Almeida, M. E. B. de. (2008) “Tecnologias na Educação: dos caminhos trilhados aos atuais desafios”. Bolema, v.21, n.29, p.99-129. Almeida, M. E. B. de. (2000) “Informática e Formação de Professores”. Ministério da Educação, Brasília. Alves, F. das. C. da S. e Batista, A. A. de M. (2016) “A Influência da Formação Docente nas Práticas Pedagógicas com o Uso do Computador”. 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