Reducing Inequalities in STEM: The Girls in Computer Science Project, Paraíba, Northeast, Brazil Josilene A. Moreira1[0000-0001-6758-204X], Giorgia Mattos1[0000-0003-2563-0255], Catarina Sales2[0000-0002-5284-4390] 1 Universidade Federal da Paraíba, Centro de Informática, Brasil 2 Universidade da Beira Interior, Covilhã, Portugal josilene@ci.ufpb.br, giorgia@ci.ufpb.br, csbo@ubi.pt Abstract. Although several initiatives are underway to stimulate the entry of women in STEM areas, they are still a minority in Brazil and worldwide. This paper presents data on inequalities in STEM around the world and the economic and social consequences for women, as well as various initiatives that are being conducted to combat them. It also presents a project currently developed in the Northeast of Brazil by the Group Girls in Computer Science from the Federal University of Paraíba (UFPB). The project currently works with students from five public high schools located in the state’s capital and in the interior, developing strategies to raise awareness about gender inequalities in Computing and to reduce them through debates about professional choices, workshops and training courses in informatics and visits to laboratories and courses of UFPB. Since 2014, the group has worked with more than 900 students, expanding the range of career possibilities to be followed by girls and empowering them to act freely in areas of their choice, even facing barriers or prejudices. Keywords: Women in Computer science, Women in STEM, Gender equality in science and technology. 1 Introdução Jovens adultos com bacharelado nas áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM) tendem a obter rendimentos médios maiores do que aqueles em áreas não-STEM [1]. Em todos os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), exceto a Estônia, adultos com educação superior em STEM apresentam maiores taxas de empregabilidade do que aqueles com formação em Artes, Humanidades, Ciências Sociais e Jornalismo; em média, a taxa de empregabilidade para pessoas graduadas em STEM fica em torno de 86% [2]. Entretanto, as mulheres continuam sub-representadas nas carreiras de STEM, apesar das inúmeras iniciativas para inseri-las nestas carreiras em todo o mundo. De acordo com [3], “Nos países europeus a percentagem de mulheres que ingressam nas universidades nas áreas de tecnologia, engenharia e ciência é baixa e, consequentemente, a sua participação no mercado de trabalho nestas áreas é também Copyright © 2020 for this paper by its authors. Use permitted under Creative Commons License Attribution 4.0 International (CC BY 4.0) muito baixa”. Na União Europeia a percentagem de mulheres em setores de alta tecnologia e serviços associados é de cerca de 32% apenas [4]. O National Center for Education Statistics, que coleta estatísticas educacionais nos Estados Unidos, mostra que embora uma alta percentagem de mulheres tenha completado o grau de bacharelado entre 2015 e 2016 (58%), apenas 36% dos diplomas de bacharelado em STEM foram atribuídos a mulheres; sendo 64% atribuídos aos homens [1]. No Japão, apenas 14,5% dos estudantes das áreas de engenharia são mulheres; elas são a maioria em humanidades (65,2%) e educação (59,1%) [5], áreas de predominância feminina em todo o mundo. No Canadá, elas são 22,3% dos profissionais de computação e sistemas de informação e 13% dos engenheiros civis, mecânicos e químicos [6]. Adicionalmente, enquanto 25% dos homens completam o curso de engenharia (média entre os países da OCDE), apenas 6% das mulheres obtém esse diploma [2]. Estas estatísticas comprovam a baixa presença feminina em tecnologia, compreendendo as áreas de STEM. No Brasil, que segue a tendência global, embora as mulheres obtenham boas notas em física e matemática durante o ensino médio, a taxa de feminização nos cursos de tecnologia e engenharia é muito baixa, especialmente em engenharia elétrica, engenharia mecânica e engenharia da computação. De acordo com o censo da educação superior (2018), a maioria dos alunos matriculados no ensino superior no Brasil são mulheres (55%). Elas superam os homens em número de matrículas na universidade (57%) e número de graduados (61%). No entanto, quando olhamos para cursos e áreas de entrada, encontramos uma polarização entre escolhas masculinas e femininas: as mulheres predominam em áreas tipicamente ligadas ao cuidado, enquanto os homens predominam em áreas tecnológicas. Entre os dez melhores cursos de graduação as mulheres são maioria em Pedagogia, Enfermagem, Psicologia, Serviço Social, Recursos Humanos, Fisioterapia e Arquitetura, enquanto os homens são a maioria em Engenharia Civil, Engenharia Mecânica, Engenharia Industrial, Informática e Engenharia Elétrica [7]. A Universidade Federal da Paraíba (UFPB), maior universidade pública do estado, localizada no Nordeste do Brasil, oferece três cursos de Ciência da Computação através do seu Centro de Informática. As mulheres são minoria em todos eles: Bacharelado em Ciência da Computação (10,4%), Engenharia da Computação (14%) e Inteligência Artificial (16%). Um estudo recente que estima cenários futuros usando regressão linear, com base no número histórico de alunos ingressantes desde 1985, mostra que o número de estudantes do sexo feminino está diminuindo a uma taxa de 0,4% ao ano para o curso de Bacharelado em Ciência da Computação [8]. Ou seja, caso não haja intervenção ou mudança de cenário, a tendência é que não haja mulheres neste curso daqui a 20 anos. As mulheres também são sub-representadas nos escalões superiores da ciência brasileira. Cientistas do sexo masculino são mais frequentemente encontrados nos níveis mais altos de bolsas de produtividade na grande área de "Engenharia, ciências exatas, ciências da terra". Além disso, eles obtêm significativamente mais financiamento, o que contribui para a perpetuação da desigualdade [9]. Diante deste quadro de disparidades, o Brasil tem lançado chamadas públicas através do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) que promovem especificamente a inserção de mulheres na tecnologia, visando mudar este quadro. A primeira chamada pública, através do edital, “18/2013 MCTI/CNPq/SPM- PR/Petrobras Meninas e jovens fazendo Ciências Exatas, Engenharias e Computação”, foi lançado em 2013 e aprovou 325 projetos em todo o Brasil. A segunda edição do edital, intitulada “CNPq/MCTIC Nº 31/2018 – Meninas nas Ciências Exatas, Engenharias e Computação” foi lançada em 2018 e aprovou inicialmente 70 projetos em todo o país. O projeto onde a pesquisa aqui descrita está inserida trabalha com mulheres na Ciência da Computação e foi selecionado na primeira chamada do edital. A partir de um grande número de ações de inclusão estabeleceu-se nacionalmente e obteve aprovação também na segunda chamada. Atualmente trabalha com cinco escolas públicas de ensino médio no estado da Paraíba, sendo três em João Pessoa (capital) e duas no interior, a 130 km. Esta interiorização tem proporcionado o conhecimento de novas realidades e necessidades, desafiando-nos a uma melhor compreensão das dificuldades que as meninas enfrentam para que possam escolher uma carreira na área de STEM. O presente artigo apresenta estatísticas globais sobre as desigualdades nas áreas de ciência, tecnologia e, especificamente, STEM, quando disponível; aponta importantes iniciativas que estão em desenvolvimento para promover o ingresso de mulheres nestas áreas e conclui relatando as principais características de um projeto brasileiro de incentivo ao ingresso de meninas e mulheres na ciência da computação, desenvolvido pelo grupo Meninas na Computação, UFPB, Brasil. 2 Panorama das Desigualdades e Estratégias de Inclusão de Mulheres em STEM 2.1 Desigualdades no Mundo Aumentar a presença das mulheres no STEM é dar-lhes a oportunidade de ter melhor renda e alcançar melhores condições sociais. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, mantendo-se a tendência atual, levará 70 anos para que a diferença salarial entre os sexos, que é estimada globalmente em 23%, seja eliminada; além disso, as desigualdades de gênero no emprego e na qualidade do trabalho causam acesso limitado à proteção social relacionada ao emprego. Como resultado, quase 65% das pessoas que estão acima da idade de aposentadoria, mas não tem acesso a qualquer aposentadoria regular, são mulheres. Isso significa que 200 milhões de mulheres na velhice vivem sem qualquer aposentadoria regular, em comparação com 115 milhões de homens [10]. Estudos recentes afirmam que, contraditoriamente, as meninas obtêm desempenho semelhante ou melhor do que os meninos em testes genéricos de alfabetização científica em todo o mundo; no entanto, as mulheres adquirem menos diplomas universitários em áreas STEM do que os homens em todas as nações avaliadas, sugerindo a perda de talentos femininos entre o ensino médio e superior na área de STEM [3][17]. Além disso, as mulheres têm piores resultados de emprego e renda, mesmo com melhor desempenho na escola, segundo a OCDE [2]. Em média, em todos os países da OCDE, as mulheres com ensino superior ganham 26% menos do que os homens com ensino superior. Este fato está diretamente relacionado às áreas e ocupações onde as mulheres trabalham, as quais são mais mal remuneradas (Educação, Saúde e Áreas Sociais, as áreas de cuidado) [2]. Portanto, a seguinte questão emerge e continua a ser investigada: "Se as mulheres tendem a ser prevalentes no sistema educacional que tipo de efeitos as mantém afastadas das áreas de STEM?". Entre os países da OCDE em média apenas 6% das mulheres completam um diploma de engenharia em comparação com 25% dos homens [2]. É possível constatar a prevalência masculina em STEM através de números mais específicos. Tomando como exemplo um país europeu de língua portuguesa, temos que Portugal apresenta uma taxa de estudantes mulheres/homens de 53,1% - 46,9%; no entanto, na área de Engenharia, a taxa é de 3,2% -12,5% de mulheres/homens do total de alunos [18]. A Universidade da Beira Interior, situada no Centro de Portugal (comparável assim à UFPB, da qual nosso projeto faz parte, devido às características regionais) apresenta uma taxa de 52% - 48% de mulheres/homens entre todos os estudantes matriculados. Entretanto, quando se considera estudantes de engenharia, estes números mudam drasticamente para 35% - 65% mulheres/homens. A desigualdade é mais acentuada em alguns cursos como Engenharia Elétrica (13% - 87%), Engenharia Eletromecânica (10% - 90%), Engenharia Civil (32% - 68%), Engenharia da Computação (9% - 91%) e Informática para Web (15% - 85%) [3]. Vários fatores têm sido citados pelos pesquisadores como causa da ausência de mulheres em STEM, entre eles: (i) estereótipos de gênero associando mulheres e feminilidade com determinadas esferas sociais e ocupações e homens a outros; (ii) a falta de modelos de profissionais mulheres (role models) de sucesso, fazendo com que as meninas tenham menos em quem se espelhar para seguir as profissões da área e (iii) a importância da família e do processo de socialização, onde os jovens tendem a realizar as expectativas dos pais e a reproduzir o modelo familiar contribuindo para a manutenção do status quo [21][22]. Assim, nesse cenário, Sales [3] afirma: "Ao mesmo tempo em que é importante mudar as representações sociais sobre a existência de áreas femininas e masculinas, também é obrigatório abrir o STEM para as meninas, destacando a necessidade social de seu talento nessas áreas". 2.2 Iniciativas no Mundo Alguns esforços importantes têm sido conduzidos a fim de eliminar as desigualdades de gênero, incluindo aquelas na Ciência e Tecnologia. A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável (ODS), em especial a Meta 5, "Alcançar a igualdade de gênero e capacitar todas as mulheres e meninas" estabelece metas importantes para promover melhores condições econômicas para as mulheres, tais como as metas 5.B, "Aprimorar o uso de tecnologias, em particular da tecnologia da informação e comunicação, para promover o empoderamento das mulheres" e 5.C, "Adotar e fortalecer políticas sólidas e legislação impositiva para a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas em todos os níveis" [11]. O equilíbrio de gênero em STEM pode ajudar a alcançar esse objetivo, e a educação é uma pedra angular para mudar as condições sociais e econômicas das mulheres. Assim, o Objetivo 5 dialoga com o Objetivo 4, "Garantir educação inclusiva e equitativa de qualidade e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos", mais especificamente o 4.4, "Garantir o acesso igualitário para todas as mulheres e homens para uma educação técnica, profissional e terciária acessível e de qualidade, incluindo a universidade" e 4.5, "Eliminar as disparidades de gênero e garantir acesso igualitário a todos os níveis de educação (...)". A ação-chave "Promovendo a igualdade de gênero em todos os níveis e tipos de educação, inclusive em relação às escolhas de carreiras em relação aos gêneros", que fez parte da iniciativa Engajamento estratégico para a igualdade de gênero 2016-2019 da União Europeia, afirma que a promoção da igualdade de gênero em STEM é uma forma de reduzir as desigualdades salariais, melhorar a renda das mulheres e reduzir os ganhos e as lacunas previdenciárias, combatendo a pobreza entre as mulheres. Estes problemas representam uma séria preocupação em vários países europeus [12]. Dada a sua importância, a ação está sendo continuada no programa Estratégia europeia para a igualdade de gênero 2020-2025, cujos principais objetivos incluem corrigir as disparidades de gênero no mercado de trabalho, assegurar uma participação equitativa em todos os setores da economia, reduzir as disparidades salariais e de pensões entre homens e mulheres, bem como as disparidade de gênero no plano da prestação de cuidados, e alcançar um equilíbrio entre homens e mulheres nos processos de tomada de decisão. Embora a estratégia se centre sobretudo em ações a levar a cabo na UE, é igualmente coerente com a política externa europeia em matéria de igualdade de gênero e de empoderamento das mulheres. Em Portugal, a estratégia de igualdade e não discriminação 2018-2030, "Plano de Ação pela Igualdade entre Mulheres e Homens", recomenda garantir condições para a participação plena e igualitária de mulheres e homens no mercado de trabalho e na atividade profissional, proporcionando uma educação livre de estereótipos de gênero e promovendo a igualdade entre homens e mulheres no desenvolvimento científico e tecnológico [13]. Além das entidades com abrangência global como a ONU com a Agenda para o Desenvolvimento Sustentável, a Organização Internacional do Trabalho e o Fórum Econômico Mundial, que possuem projetos para diminuir as desigualdades no campo de trabalho, várias estratégias e programas não governamentais estão promovendo a igualdade de gênero em ciência e tecnologia. Entre elas estão o IEEE Women in Engineering [14], Women's Engineering Society [15] e ACM-W for Women in Computing [16]. Outras organizações e projetos têm ainda trabalhado para reduzir as desigualdades de gênero no campo acadêmico e profissional, incluindo [3]: • EGERA - Igualdade de Gênero Efetivo na Pesquisa e Academia [23], que visa promover medidas para alcançar a igualdade e combater estereótipos de gênero na pesquisa e na academia; • PLOTINA - Promoção do equilíbrio de gênero e inclusão em pesquisa, inovação e formação [24], com objetivo semelhante; • WEPAN – Women in Engineering ProActive Network [25], que é uma rede de estudantes de engenharia de mulheres norte-americanas que trabalha para transformar a cultura na educação de engenharia para atrair, reter e se formar mulheres, e • MWM - Milhões de Mulheres Mentoras [26], um movimento norte-americano para despertar o interesse e a confiança de meninas e mulheres para perseguir e ter sucesso em estudos STEM, carreiras e oportunidades de liderança através do poder de mentoria. Ainda no contexto de Portugal, há um projeto-piloto que visa mudar essa realidade, intitulado "Mulheres engenheiras por um dia" [27]; é desenvolvida sob a "Agenda de igualdade no mercado de trabalho e nas empresas", enquadrada na "Estratégia Nacional de Igualdade e Não Discriminação 2018-2030". O projeto "visa combater e prevenir a intensificação da segregação de ocupações profissionais, com foco em especial na ausência de meninas nas áreas de engenharia e tecnologias". Os parceiros do projeto incluem 25 escolas, 20 empresas e 10 universidades, incluindo a Universidade da Beira Interior (UBI) [3]. Esta universidade distingue-se por ter criado em 2011 um Plano de Igualdade de Gênero (GEP), que fez dela a pioneira na Academia Portuguesa em ações de igualdade. As ações do GEP levaram à criação do Comitê de Igualdade de Gênero da UBI em 2013, com o objetivo de promover e monitorar as desigualdades de gênero na instituição, assim como reunir e analisar dados quantitativos e qualitativos de gênero [28]. Além de monitorar as desigualdades, o comitê também lançou outras iniciativas como a formação "Gênero, Igualdade e Cidadania" para educadores e professores da educação infantil, ensino médio e superior, para conscientizar sobre a perspectiva de gênero em ambientes acadêmicos, de pesquisa e de carreira. O comitê também participa ativamente no já citado projeto português "Mulheres engenheiras por um dia", levando alunas de cursos da área de STEM para as escolas de ensino médio, a fim de dialogarem sobre as suas dificuldades e superações ao ingressarem em cursos predominantemente masculinos. Estes são alguns exemplos de iniciativas ao redor do mundo. No entanto, mesmo com tais esforços, a diferença de gênero na ciência e tecnologia persiste. 2.3 Desigualdades e Iniciativas no Brasil e no Estado da Paraíba Tabela 1. Estudantes mulheres em cursos de tecnologia na UFPB [20]. Curso Graduação Mestrado Doutorado Engenharia mecânica 11% 21,3% 16,3% Engenharia civil 28% 49,3% 50% Física 11% 18,7% 16,9% Matemática 21% 18,7% 24,3% Bacharelado em computação 10% 13,5% - Engenharia da Computação 14% 13,5% - No Brasil as mulheres representam 55% dos estudantes ingressantes no ensino superior, sendo 57% dos alunos matriculados e 61% dos graduados sendo, portanto, a maioria nestes três segmentos de estudantes. No entanto a taxa muda para 29,3% - 70,7% (mulheres/homens) na área de engenharia [19]. O panorama STEM da UFPB, na qual nosso projeto de incentivo ao ingresso de mulheres na computação tem sido conduzido, é apresentado na Tabela 1. No Brasil, uma ação diferenciada para a inclusão das mulheres na ciência e tecnologia foi iniciada pelo governo federal em 2005, por meio do "Plano Político para as Mulheres": o programa "Mulheres e Ciência". Esta ação fez parte da "Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2016 - 2019" (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações - MCTIC), que tem como objetivo combater as desigualdades, implementar uma política de gênero e promover a paridade nas instituições científicas [29][30]. Este programa tem sido continuado a partir de 2020; entretanto, desenvolve apenas ações isoladas que não são capazes de mudar a realidade para o país. O referido programa Mulheres e Ciência lança anualmente o prêmio "Construindo a Igualdade de Gênero" sendo um dos seus objetivos "Promover a participação das mulheres no campo da ciência e das carreiras acadêmicas". Como parte de suas ações, em 2013 foi lançada uma chamada pública intitulada "Meninas e jovens fazendo ciências exatas, engenharia e computação”, financiada conjuntamente pelo CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, pelo MCTIC e pela Secretaria Política da Mulher (SPM), com apoio da Petrobras. Foram selecionados 325 projetos em todo o país, 170 coordenados por mulheres e 155 por homens; no entanto, na região Nordeste do país, onde prevalece o sexismo, a maioria dos projetos foi coordenada por homens (55 contra 38). No estado da Paraíba, foram selecionados dez projetos; a partir dessa iniciativa foi criado o grupo "Meninas na Computação", permanecendo até os dias atuais e sendo reconhecido nacionalmente [31]. Em 2018, foi lançada a segunda edição desta chamada pública com orçamento menor para o período 2019-2020 (cerca de 70 projetos selecionados no Brasil); o referido projeto obteve aprovação de uma proposta novamente e atualmente está trabalhando em cinco escolas públicas de ensino médio do estado da Paraíba [32]. A Sociedade Brasileira de Ciência da Computação – SBC incentiva e indexa diversas iniciativas para a inserção feminina na Computação, através do programa Meninas Digitais. Muitos dos projetos que surgiram através dos editais lançados pelo CNPq hoje integram a iniciativa e promovem ações em todo o país na temática da promoção da igualdade em STEM, especificamente em computação. As ações do Meninas Digitais incluem a criação e manutenção de um portal que agrega todos os projetos vinculados ao programa, um evento anual “WIT - Women in Technology", com publicações referentes à temática e um fórum anual para apresentar e discutir os projetos integrantes, intitulado Fórum Meninas Digitais [33]. 3 Estratégias para Redução das Desigualdades de Gênero na Ciência da Computação no Nordeste do Brasil: o caso do grupo Meninas na Computação 3.1 O Grupo O grupo Meninas na Computação, responsável pelo relato de experiência aqui apresentado, tem desenvolvido projetos na área de inserção feminina na Computação desde 2014, quando da aprovação de uma proposta na chamada pública 18/2013 MCTI/CNPq/SPM-PR/Petrobras Meninas e jovens fazendo Ciências Exatas, Engenharias e Computação. Desde então tem desenvolvido ininterruptamente diversas iniciativas de extensão e pesquisa que reproduzem e aperfeiçoam a sistemática da primeira proposta implantada. A atuação inclui pesquisa e extensão na forma de PROBEX (projetos de extensão da própria universidade, 2014 a 2020) PROEXT (projeto a nível nacional apoiado pelo Ministério da Educação, 2016) e PIBIC (iniciação científica do CNPq, 2014 a 2019). Atualmente conduz a proposta aprovada na chamada pública “CNPq/MCTIC Nº 31/2018 – Meninas nas Ciências Exatas, Engenharias e Computação” e um projeto de extensão (PROBEX 2020). A Tabela 2 apresenta as escolas participantes desde o início da atuação do grupo, que já interagiu e capacitou mais de 900 alunas. Tabela 2. Escolas participantes. Fonte: Elaborada pelo autor (2020). Escola Período Escola Matheus Augusto de Oliveira – Bairro dos Estados 2014 Escola Estadual Rebeca Simões - Mangabeira 2015 a 2020 Escola Técnica Estadual João Pereira Gomes Filho - Mangabeira 2016, 2018 Escola Liliosa Paiva - Cristo 2016, 2017 Escola Municipal Paulino Siqueira - Cabedelo 2017 Escola Frei Orlando - Itambé 2017 Escola Técnica Estadual João Pereira Gomes – Mangabeira 2016, 2018 a 2020 Escola Estadual Professor Celestin Malzac - Valentina 2019, 2020 Escola Estadual José Rocha Sobrinho - Bananeiras 2019, 2020 Escola Estadual Márcia Guedes Alcoforado - Belém 2019, 2020 3.2 O Projeto O projeto tem como principal objetivo despertar a vocação das meninas para a área de Ciência da Computação através da capacitação em Tecnologias da Informação e Comunicação. A capacitação para lidar com os artefatos tecnológicos desperta vocações para a área de computação, além de empoderá-las, aumentando a percepção de autoeficácia e o background para ingressarem em cursos de computação posteriormente. No período de 2019 a 2020 o projeto está sendo desenvolvido em cinco escolas de ensino médio do estado da Paraíba, sendo três na capital e duas no interior. Financiado pelo CNPq, oferece uma estrutura que conta com um professor e três alunas bolsistas em cada escola pública e três alunas bolsistas no ensino superior, além da coordenação que conta com duas professoras da UFPB. As principais estratégias utilizadas são: ─ Ministração de palestras sobre as desigualdades de gênero na ciência e tecnologia, principalmente na Ciência da Computação. Estas palestras são seguidas por debates onde as alunas expõem suas experiências sobre discriminações ou diferenças de tratamento já vivenciadas devido ao gênero. ─ Rodas de conversa com as alunas do ensino superior (bolsistas e voluntárias) em Computação da UFPB. Nestas rodas de conversa as alunas apresentam as suas experiências ao ingressarem nos cursos majoritariamente masculinos, o que motiva geralmente intensos debates e perguntas sobre como superar as dificuldades enfrentadas. Também são debatidos os problemas encontrados para aprender programação, o que estimula as alunas do ensino médio a ingressarem nas oficinas que são oferecidas pelo projeto. ─ Oficinas de capacitação em tecnologia. As alunas são capacitadas no uso das tecnologias digitais utilizando diferentes estratégias e softwares, entre eles: (a) oficinas de programação em C; (b) minicursos de desenvolvimento de aplicativos usando o App Inventor (disponibilizado gratuitamente pelo MIT); (c) oficinas de desenvolvimento de jogos com o Construct 2; (d) oficinas de desenvolvimento de blogs com temas de interesse das alunas das escolas, e (e) minicurso de robótica. Os cursos são sempre adaptados a cada escola, disponibilidade de laboratórios, internet e softwares. Geralmente é necessário promover encontros e cursos nos laboratórios da Universidade, uma vez que as escolas são carentes de recursos. ─ Visitas técnicas aos laboratórios e cursos de Computação da UFPB, incluindo laboratórios de Inteligência Artificial, Robótica, Drones e Desenvolvimento de Software, entre outros. As visitas são extremamente importantes e ressaltadas pelas alunas do ensino médio como um estímulo para o objetivo de ingressar em um curso superior. ─ Os professores das escolas parceiras integram os treinamentos, para que tenham uma participação ativa e possam dar continuidade às oficinas e minicursos, além de poderem colaborar na instrução das alunas do ensino médio durante as ações desenvolvidas ao longo do ano. As redes sociais são atualizadas pelas alunas do ensino superior para dar visibilidade às ações realizadas durante todo o projeto. Os principais resultados tanto do projeto como do grupo vão além de incentivá-las a ingressar em cursos de tecnologia e computação. Podemos elencar alguns, colhidos através de declarações das alunas: • O empoderamento das meninas do ensino médio, que passam a acreditam que são capazes de atuar na área de tecnologia, pois aprendem na prática a lidar com diferentes áreas da computação; • O conhecimento em áreas de computação, ampliando as opções de escolha das meninas do ensino médio para futuras carreiras, pois normalmente as meninas permanecem em áreas onde sentem-se mais confortáveis, como cuidado, saúde e educação; • Quebra de paradigmas quanto à impossibilidade de adentrar em uma Universidade pois, ao conhecer alunas também de escolas públicas que conseguiram alcançar este objetivo, as estudantes sentem-se mais fortalecidas para buscar este novo objetivo de vida; • Melhoria da autoestima e autoconfiança, uma vez que as alunas do ensino médio passam a sentir-se mais seguras ao lidar com artefatos tecnológicos através do conhecimento em oficinas práticas de curta duração, e • Um sentimento de pertencimento das meninas dos cursos superiores, uma vez que passam a apoiar umas às outras quando ingressam em um dos projetos do grupo. As alunas do ensino superior, por serem sempre minoria nos cursos e nas turmas, sentem-se isoladas, tendo dificuldade de integrar-se tanto acadêmica como socialmente na Universidade. De acordo com o testemunho de várias delas, a participação no projeto exerce o papel de mantê-las integradas e ajudando a que não desistam durante as dificuldades encontradas, sejam acadêmicas ou de ordem psicológica. 4 Comentários Finais As áreas de STEM são predominantemente masculinas: na União Europeia, apenas 6% das mulheres obtém diplomas de engenharia, contra 25% dos homens; no Japão elas são apenas 14,5% dos estudantes de engenharia e, no Brasil elas também são minoria dos ingressantes em engenharia, apenas 29,3%. Este quadro global pode ser modificado através da educação. Iniciativas em todo o mundo procuram incentivar as mulheres a ingressarem em tecnologia, pois assim poderão obter melhores empregos e renda, melhorando suas perspectivas econômicas e sociais: a taxa de empregabilidade de pessoas graduadas em STEM é de 86% na União Europeia. Iniciativas em todo o mundo têm sido conduzidas a fim de promover a inclusão feminina na ciência e tecnologia. Estas iniciativas vão desde a Agenda para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, que estabelece metas para aprimorar o uso de tecnologias por parte das mulheres e a adoção de políticas para a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento econômico e social das mulheres e meninas, perpassam por iniciativas da Organização Internacional do Trabalho e do Fórum Econômico Mundial, que objetivam melhorar as condições econômicas e oportunidades de emprego para as mulheres, chegando até iniciativas no nosso país, o Brasil, através do Programa Mulher e Ciência, que lança editais visando a igualdade na Ciência e Tecnologia. O projeto de que trata este relato, coordenado pelo grupo Meninas na Computação da UFPB, situado na região Nordeste do Brasil, é fruto de um destes editais. O projeto tem desenvolvido ações a nível de escolas estaduais do ensino médio, a fim de capacitar e incentivar mulheres a ingressarem na tecnologia, reduzindo assim as desigualdades. Os principais resultados têm sido acompanhar o crescimento do conhecimento tecnológico, a melhoria do senso de autoeficácia e o empoderamento das meninas, que passam a acreditar que são capazes de atuar nas carreiras que decidirem escolher, inclusive naquelas que envolvem a tecnologia e a computação. Agradecimentos Agradecemos ao CNPq e MCTIC o financiamento desta pesquisa. Referências 1. National Center for Education Statistics. Status and Trends in the Education of Racial and Ethnic Groups, https://nces.ed.gov/programs/raceindicators/indicator_reg.asp#f1, acessado em 12/04/2020. 2. OECD, Education at a Glance 2017. Acessado em 30/05/2020. 3. Santos, B, Calado, R., Oliveira, Catarina S. Careers without Gender: Strategies to Promote Gender Equality in Engineering. Proc. of INTED2019, Valencia, Spain (2019). 4. HESA Higher Education Statistics Agency, Data Analysis, https://www.hesa.ac.uk/data- and-analysis, acessado em 14/05/2020. 5. 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